Domingo, 7 de Dezembro de 2008

SÓCRATES E A LIBERDADE,

por António Barreto in "Publico"

 

EM CONSEQUÊNCIA DA REVOLUÇÃO DE 1974 , criou raízes entre nós a ideia de que qualquer forma de autoridade era fascista. Nem mais, nem menos.
Um professor na escola exigia silêncio e cumprimento dos deveres?
Fascista! Um engenheiro dava instruções precisas aos trabalhadores no estaleiro? Fascista! Um médico determinava procedimentos específicos no bloco operatório? Fascista! Até os pais que exerciam as suas funções educativas em casa eram tratados de fascistas.
Pode parecer caricatura, mas essas tontices tiveram uma vida longa e inspiraram decisões, legislação e comportamentos públicos. Durante anos, sob a designação de diálogo democrático, a hesitação e o adiamento foram sendo cultivados, enquanto a autoridade ia sendo posta em causa. Na escola, muito especialmente, a autoridade do professor foi quase totalmente destruída.  
EM TRAÇO GROSSO, esta moda tinha como princípio a liberdade. Os denunciadores dos 'fascistas' faziam-no por causa da liberdade. Os demolidores da autoridade agiam em nome da liberdade. Sabemos que isso era aparência: muitos condenavam a autoridade dos outros, nunca a sua própria; ou defendiam a sua liberdade, jamais a dos outros. Mas enfim, a liberdade foi o santo e a senha da nova sociedade e das novas culturas. Como é costume com os excessos, toda a gente deixou de prestar atenção aos que, uma vez por outra, apareciam a defender a liberdade ou a denunciar formas abusivas de autoridade. A tal ponto que os candidatos a déspota começaram a sentir que era fácil atentar, aqui e ali, contra a liberdade: a capacidade de reacção da população estava no mais baixo.
POR ISSO SINTO INCÓMODO em vir discutir, em 2008, a questão da liberdade. Mas a verdade é que os últimos tempos têm revelado factos e tendências já mais do que simplesmente preocupantes. As causas desta evolução estão, umas, na vida internacional, outras na Europa, mas a maior parte residem no nosso país. Foram tomadas medidas e decisões que limitam injustificadamente a liberdade dos indivíduos. A expressão de opiniões e de crenças está hoje mais limitada do que há dez anos. A vigilância do Estado sobre os cidadãos é colossal e reforça-se. A acumulação, nas mãos do Estado, de informações sobre as pessoas e a vida privada cresce e organiza-se. O registo e o exame dos telefonemas, da correspondência e da navegação na Internet são legais e ilimitados. Por causa do fisco, do controlo pessoal e das despesas com a saúde, condiciona-se a vida de toda a população e tornam-se obrigatórios padrões de comportamento individual.
O CATÁLOGO É ENORME. De fora, chegam ameaças sem conta e que reduzem efectivamente as liberdades e os direitos dos indivíduos. A Al Qaeda, por exemplo, acaba de condicionar a vida de parte do continente africano, de uma organização europeia, de milhares de desportistas e de centenas de milhares de adeptos. Por causa das regulações do tráfego aéreo, as viagens de avião transformaram-se em rituais de humilhação e desconforto atentatórios da dignidade humana. Da União Europeia chegam, todos os dias, centenas de páginas de novas regulações e directivas que, sob a capa das melhores intenções do mundo, interferem com a vida privada e limitam as liberdades. Também da Europa nos veio esta extraordinária conspiração dos governos com o fim de evitar os referendos nacionais ao novo tratado da União.
MAS NEM É PRECISO IR LÁ FORA. A vida portuguesa oferece exemplos todos os dias. A nova lei de controlo do tráfego telefónico permite escutar e guardar os dados técnicos (origem e destino) de todos os telefonemas durante pelo menos um ano. Os novos modelos de bilhete de identidade e de carta de condução, com acumulação de dados pessoais e registos históricos, são meios intrusivos. A vídeovigilância, sem limites de situações, de espaços e de tempo, é um claro abuso. A repressão e as represálias exercidas sobre funcionários são já publicamente conhecidas e geralmente temidas A politização dos serviços de informação e a sua dependência directa da Presidência do Conselho de Ministros revela as intenções e os apetites do Primeiro-ministro. A interdição de partidos com menos de 5.000 militantes inscritos e a necessidade de os partidos enviarem ao Estado a lista nominal dos seus membros é um acto de prepotência. A pesada mão do governo agiu na Caixa Geral de Depósitos e no Banco Comercial Português com intuitos evidentes de submeter essas empresas e de, através delas, condicionar os capitalistas, obrigando-os a gestos amistosos. A retirada dos nomes dos santos de centenas de escolas (e quem sabe se também, depois, de instituições, cidades e localidades) é um acto ridículo de fundamentalismo intolerante. As interferências do governo nos serviços de rádio e televisão, públicos ou privados, assim como na 'comunicação social' em geral, sucedem-se. A legislação sobre a segurança alimentar e a actuação da ASAE ultrapassaram todos os limites imagináveis da decência e do respeito pelas pessoas. A lei contra o tabaco está destituída de qualquer equilíbrio e reduz a liberdade.
NÃO SEI SE SÓCRATES É FASCISTA. Não me parece, mas,sinceramente, não sei. De qualquer modo, o importante não está aí. O que ele não suporta é a independência dos outros, das pessoas, das organizações, das empresas ou das instituições. Não tolera ser contrariado, nem admite que se pense de modo diferente daquele que organizou com as suas poderosas agências de intoxicação a que chama de comunicação. No seu ideal de vida, todos seriam submetidos ao Regime Disciplinar da Função Pública, revisto e reforçado pelo seu governo. O Primeiro-ministro José Sócrates é a mais séria ameaça contra a liberdade, contra autonomia das iniciativas privadas e contra a independência pessoal que Portugal conheceu nas últimas três décadas TEMOS DE RECONHECER: tão inquietante quanto esta tendência insaciável para o despotismo e a concentração de poder é a falta de reacção dos cidadãos. A passividade de tanta gente. Será anestesia? Resignação?
Acordo? Só se for medo...
 António Barreto \ Público"

publicado por negra às 18:02
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Segunda-feira, 1 de Dezembro de 2008

Se o óbvio não interessa

 

Se o óbvio não interessa aos seus olhos
Porque parece o óbvio variar segundo os olhos
Que venham hostes de quem menos cego
Tenta provar o que não precisa de adeptos
Para ser verdade.
Mas as multidões não se medem em números
Medem-se em conveniência
E se já afogados estamos em mentiras
Porque não afogar-nos também em águas pútridas?
 
Talvez a inundação turva melhor reflicta
O que nas mentes de outras multidões revira.
 
Eu não sei, não vejo com olhos de contas
Nem sequer com olhos políticos,
Talvez por ignorância não se me infiltrem
As verdadeiras razões pela razão dentro.
 
Não é talvez a verdade o centro de qualquer disputa
E as mentiras têm valor relativo
Assim como a vida tem valor relativo
E rios e beleza têm valores relativos.
 
Relativamente à inutilidade de protesto pela verdade
Não tenho muitas dúvidas
Nem a considero relativa.
 
Destruam, inundem e matem
Mas que é óbvio que o fazem
Não tentem contestar.
Não precisam de o fazer de qualquer forma.
 
Quem contesta e fala e protesta
Não tem que o fazer mas fá-lo
Porque acredita,
Até que finalmente lhes mostram
Que há outras evidências mais relevantes
Que as evidências óbvias claras manifestas.
 
Ana Paula Sardoeira
publicado por negra às 01:00
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Até parece que conhecem o meu rio…

 

Até parece que entendem muito de rios, afluentes, algas, microrganismos nefastos sem grande importância.
Até se crê que estudaram bem a lição e pesaram as consequências da construção de uma barragem, ao enaltecer os lucros e ao afastar a dimensão da catástrofe ambiental.
Até se concorda com os argumentos de que a agricultura nesta (e noutras) zonas já não dá nada e se compreende que, mediante a perspectiva de ganhar alguns trocados com as supostas indemnizações, se encham de esperança as almas vazias daqueles para quem o rio nunca deve ter servido senão para lhes fornecer água.
Quem não consegue compreender que a palavra benefícios nunca poderá caracterizar o que está a ser projectado para o rio Tâmega é porque nunca o sentiu como seu. Este rio faz parte da vida e está na alma de muitas gentes ribeirinhas que com ele partilharam momentos únicos de cumplicidade. Os beneficiados nunca serão os nossos filhos, porque se a barragem vier a ser construída jamais poderão experimentar a sensação de plenitude que se vive quando, na calma do seu leito, se mergulha e se encontra uma paz total de comunhão com a Natureza. Qual reencontro entre mãe e filho!
Toda a minha infância e toda a minha adolescência foram passadas ao lado do rio. No Inverno, o leito enchia-se com as chuvas e as águas que corriam dos caminhos. Espreitava à janela para ver se já tinha crescido mais um pouco, se o barco preso aos ramos dos amieiros ainda lá estava. À noite adormecia com o ressoar das águas agitadas que me embalava e garantia a normalidade da existência humana. Chegada a Primavera, olhava-O da mesma janela para ver o quanto tinha já descido, e contava os dias que faltavam para a chegada do tempo quente de Verão, para de novo nele alegrar os meus dias de menina.
Nadei horas perdidas neste rio. Ri, joguei, brinquei. Faz parte de mim e de muitos outros para quem o anunciado desaparecimento do Rio Tâmega e todo o seu habitat será a morte de um ente muito querido. Guardo ternamente, com saudade, imagens do “meu” rio de quem aos poucos me fui afastando. Após a construção da barragem do Torrão suas águas começaram a sofrer com a estagnação das correntes e a poluição que nelas se foi acumulando. Aos poucos as praias fluviais foram-se tornando cada vez mais desertas. Sempre tive esperança que os senhores com poder neste país, nesta cidade, neste rio investissem dinheiros para despoluir e recuperar o rio Tâmega. Só esta é a atitude aceitável de quem ama – recuperar e proteger. Nunca destruir, como parece quererem fazer.
Enquanto amarantina, desgostam-me profundamente os falseados argumentos a favor da construção da barragem, pretendendo fazer-nos acreditar na suposta criação de empregos, miragens de negócios e receitas daí adjacentes que nos trarão o bem-estar e o progresso. O que eles ainda não descobriram é que essa felicidade é podre e não se renova com a passagem das estações, como a daqueles que amam verdadeiramente o rio.
Até parece que conhecem o meu rio…
 

Ana Catarina Costa

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publicado por negra às 00:58
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CARTA ABERTA AO SENHOR ALEXANDRE PANDA, DIRECTOR ADJUNTO DO JORNAL REPÓRTER DO MARÃO

Exmo. Sr. Alexandre Panda,

 
Estive a ler atentamente o artigo que o senhor assina no destaque do jornal Repórter do Marão de 20 de Novembro, e a indignação é tanta que rasgar o jornal não chega, tenho que lhe dizer que o seu jornalismo habilidoso não encontra uma via verde na inteligência de todos os que o lêem.
Não estou propriamente preocupado se aquilo que o senhor Panda escreve é resultado apenas da sua ignorância, ou se, como me parece mais óbvio, é fruto de uma manhosa encomenda de quem se serve dos fracos de personalidade para promover os seus elevados interesses.
Todo o artigo é habilidoso, a começar pelo título em destaque na primeira página, onde se afirma que a construção da barragem irá gerar negócios em Fridão, acrescentando-se ainda o pormenor de que essa obra trará “Oportunidades na venda de terrenos em Amarante e Celorico de Basto”. Esta suposta notícia aparece depois, obviamente, nas páginas centrais do jornal, a cores, tal é a importância e seriedade da informação veiculada. Só que o senhor Panda não teve o cuidado de sublinhar que tudo se situa no plano da possibilidade. Não utilizou nenhuma oração condicional, não se serviu de nenhuma combinação verbal que desse a entender aos incautos leitores que a peça jornalística irá apenas testemunhar as crenças das populações, cujo digno representante parece ser o senhor Abílio Moura, um humilde e ilustre proprietário de terrenos, convencido (não importa quem o convenceu, se um abutre disfarçado de pomba, se a inocência grávida de ambição) que aquela barragem será o seu euromilhões. O senhor Abílio diz saber, embora não diga quem lho garantiu, que o Estado o irá contactar “para tratar da questão da indemnização”, que isso ainda não aconteceu, «mas não deve demorar», e que, entretanto, como sublinha o atento repórter, sem qualquer maldade nas entrelinhas, ““esfrega as mãos” a pensar na indemnização.”.
No terceiro parágrafo do seu extra ordinário artigo, o senhor Panda escreve que em Fridão há opiniões divididas, que há quem esteja preocupado com as consequências ambientais (humidade excessiva, descontrole do ecossistema natural) e até mesmo com a ameaça de uma catástrofe possível que destruiria Amarante. No entanto, o senhor Panda compõe o seu brilhante artigo com um contra-argumento (seleccionado ao acaso entre os muitos que o senhor Artur Moreira, uma autoridade na localidade de Fridão) que me fez corar de vergonha: poderão ocorrer vários fenómenos ambientais graves, Amarante até poderá ser destruída, “Mas, por outro lado, também vai trazer empregos, novas acessibilidades e oportunidades de negócio com o desenvolvimento do turismo fluvial.”.
Que bonito, senhor Panda! Já estamos todos a imaginar o reflorescer da actividade turística na Amarante futura, com resmas de curiosos a fotografar as ruínas de São Gonçalo. Que interessante será o mundo poder assistir a excelentes documentários da National Geographic sobre as pragas de insectos no Vale do Tâmega, ou as belas reportagens sobre os safaris nas margens da Cascata do Tâmega, uma multidão de caçadores que ocorrerá à região para participar nas batidas às ratazanas. É claro que até a indústria naval reflorescerá com a necessidade de construir quilhas capazes de lavrar no espesso tapete de micro-algas.
Aliás, o senhor Abílio Moura, o senhor Artur Moreira, o senhor Rodrigo da Silva, o senhor Bruno Machado, o senhor Pedro Moura, e, naturalmente, o senhor Panda estão todos certos que as populações a montante de Amarante irão ser tão beneficiadas, lucrarão tanto com a construção de mais quatro (não é uma; são mais quatro, senhor Panda) barragens no Tâmega e seus afluentes, como o foram as populações que ladeiam o pântano chamado Barragem do Torrão: vendas milionárias de terrenos, novas moradias, passeios no rio, competições em motas de água (?!!), imensos restaurantes com uma gastronomia feita à base de roedores, insectos e peixes estranhos – tudo, tudo mais valias proporcionadas pela construção da barragem do Torrão; tudo fruto da excepcional qualidade das águas do Tâmega.
Perdoe-me o sarcasmo senhor Panda, mas só quem nunca foi ao Torrão, só quem é completamente ignorante em relação a tantos outros casos de desrespeito pelos mais elementares direitos das populações (como aconteceu recentemente no Alqueva), só quem nunca reparou que as barragens construídas em Portugal foram sempre implantadas em regiões pobres, e que, passadas décadas, continuam pobres, porque ninguém lhes pagou o que lhes foi prometido, e porque agora têm ainda menos do que no tempo em que lhes compraram as vontades com um saco de rebuçados envenenados.
Se o senhor Panda fosse um jornalista a sério, se o seu artigo não fosse um punhado de areia atirado aos olhos do povo, o senhor faria aquilo que se espera de uma pessoa credível: investigaria. Nessa altura, no seu artigo, consideraria a hipótese da gente da sua terra poder estar (a ser) enganada. Sabe porquê? Porque a população não sabe que as grandes barragens são construídas em regime de condomínio fechado, pelo que o senhor Pedro Moura ou o senhor Rodrigo da Silva não venderão uma única alface, uma cerveja ou uma galinha à construtora da barragem. Porque os terrenos desapropriados, se algum dia forem pagos (investigue outros casos ocorridos no nosso país), serão comprados de acordo com o valor matricial declarado nas finanças – uma ninharia, portanto. Porque os empregados das grandes construtoras são emigrantes de leste, africanos ou brasileiros, mão-de-obra mais barata do que os necessitados operários da região. Porque ninguém quer tomar banho em águas podres. Porque ninguém quer construir uma casa de férias junto a um pântano. Por tantos e tantos motivos que o senhor não conhece ou não considera dignos de serem referenciados no seu vaidoso artigo, senhor Panda.
O senhor Alexandre Panda também nunca se terá questionado se cinco barragens numa mesma região não será demais. O senhor também não parece estar muito interessado em publicitar o transvase do rio Olo, de forma a alimentar a barragem de Gouvães. Não o incomoda o facto dessa acção ter consequências irreversíveis do ponto de vista ambiental, social e cultural, destruindo o mesmo rio e uma das paisagens naturais mais belas do nosso país: as fisgas de Ermelo.
O senhor Panda começa o seu artigo informando-nos que existe uma oposição à construção da barragem de Fridão, “essencialmente em Amarante”, mas não se digna a identificar nem a caracterizar esse movimento cívico de oposição, não pensou que seria pertinente escutar essa opinião e citá-la no seu artigo. Aliás, o senhor Panda não sabe, mas o Movimento de Cidadania de oposição à construção da barragem tem núcleos dinâmicos em toda a região, incluindo Celorico de Basto, Mondim e Ermelo. O senhor não sabe que a recente petição colocada on-line conta já com mais de 1300 assinaturas, onde constam muitos nomes de cidadãos das zonas que o senhor diz estarem identificadas com o projecto da barragem. Neste momento, há muitos amarantinos espalhados pelo mundo que vivem com grande angústia a possibilidade dessa construção e que estão disponíveis para lutar contra quem quer roubar o “seu rio” transformando-o numa imensa cascata de betão. Neste momento, há jovens estudantes que escolheram o impacto ambiental com a construção da barragem como tema dos seus trabalhos na disciplina da Área de Projecto. Também não sabe que esses jovens escrevem canções de protesto, escrevem textos de revolta que editam em diversos blogues solidários com a causa do Movimento de Cidadania. O senhor não sabe, mas continua a escrever.
O senhor Panda não sabe de muita coisa, porque provavelmente só sabe o que lhe convém. Enquanto director adjunto de um jornal local, cuja principal função deve ser informar e não desinformar, estar atento às ameaças que coloquem em perigo a qualidade de vida dos seus potenciais leitores, a sua posição deixa muito a desejar. Um dia, não se admire se alguém lhe atribuir uma co-responsabilidade moral pelo assassinato de toda uma região.
Talvez não seja por acaso que o senhor se chama Panda. O senhor Alexandre move-se muito devagar, só se alimenta de folhas seleccionadas e vive em cativeiro. O panda é um animal em vias de extinção. Mas, infelizmente, jornalistas da sua espécie há muitos.
 
António Costa
(um dos subscritores da Petição Anti-Barragem - Salvar o Tâmega e a Vida no Olo)
 
publicado por negra às 00:53
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Segunda-feira, 17 de Novembro de 2008

Avaliação dos professores - se o modelo é tão bom...

Avaliação dos professores

Opinião de uma advogada


Já que muitos jornalistas e comentadores defendem e compreendem o modelo proposto para a avaliação dos docentes, estranho que, por analogia, não o apliquem a outras profissões (médicos, enfermeiros, juízes, etc.).

Se é suposto compreenderem o que está em causa e as virtualidades deste modelo, vamos imaginar a sua aplicação a uma outra profissão, os médicos.

A carreira seria dividida em duas:

Médico titular (a que apenas um terço dos profissionais poderia aspirar) e Médico.

A avaliação seria feita pelos pares e pelo director de serviços. Assim, o médico titular teria de assistir a três sessões de consultas, por ano, dos seus subordinados, verificar o diagnóstico, tratamento e prescrição de todos os pacientes observados. Avaliaria também um portefólio com o registo de todos os doentes a cargo do médico a avaliar, com todos os planos de acção, tratamentos e respectiva análise relativa aos pacientes.

O médico teria de estabelecer, anualmente os seus objectivos: doentes a tratar, a curar, etc.
A morte de qualquer paciente, ainda que por razões alheias à acção médica, seria penalizadora para o clínico, bem como todos os casos de insucesso na cura, ainda que grande parte dos doentes sofresse de doença incurável, ou terminal. Seriam avaliados da mesma forma todos os clínicos, quer a sua especialidade fosse oncologia, nefrologia ou cirurgia estética...

Poder-se-ia estabelecer a analogia completa, mas penso que os nossos 'especialistas' na área da educação não terão dificuldade em levar o exercício até ao fim.

A questão é saber se consideram aceitável o modelo?

Caso a resposta seja afirmativa, então porque não aplicar o mesmo, tão virtuoso, a todas as profissões?

Será???!!!

 

Já agora...

Poderiam começar a 'experiência' pela Assembleia da República e pelos (des)governantes...  

publicado por negra às 22:15
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Sexta-feira, 14 de Novembro de 2008

Viva a política em Portugal!

Devido ao meu envolvimento no movimento cívico de oposição à construção da barragem de Fridão, percebi que há muitos ex-ministros e ex-secretários de estado que, depois de abandonarem as suas funções governativas, ocupam altos cargos em empresas ou bancos, com ordenados e regalias de sonho. Curiosamente, fica a sensação que quanto mais incompetente foi o seu trabalho no governo de que fez parte melhor o cargo conquistado. Duvida? Vejamos!

 

Por exemplo,...

 

Pina Moura:

Antes- ministro que definiu o Programa Nacional de barragens com Elevado Potencial Hidroeléctrico;
Agora- presidente da Iberdrola, S.A., empresa espanhola que conseguiu «ganhar» o concurso para a construção das barragens no rio Beça – Padroselos, e no rio Torno/Louredo – Gouvães (a tal que vai secar o rio Olo)

 

Fernando Nogueira:
Antes -Ministro da Presidência, Justiça e Defesa
Agora - Presidente do BCP Angola

 

José de Oliveira e Costa:
Antes -Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais
Agora -Presidente do Banco Português de Negócios (BPN)

 

Rui Machete:
Antes - Ministro dos Assuntos Sociais
Agora - Presidente do Conselho Superior do BPN; Presidente do Conselho Executivo da FLAD

 

Armando Vara:
Antes - Ministro adjunto do Primeiro Ministro
Agora - Vice-Presidente do BCP

 

Paulo Teixeira Pinto:
Antes - Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros
Agora - Presidente do BCP (Ex. - Depois de 3 anos de 'trabalho',
Saiu com 10 milhões de indemnização!!! e mais 35.000€ x 15 meses por ano até morrer...)

 

António Vitorino:
Antes -Ministro da Presidência e da Defesa
Agora -Vice-Presidente da PT Internacional; Presidente da Assembleia Geral do Santander Totta - (e ainda umas 'patacas' como comentador RTP)

 

Celeste Cardona:
Antes - Ministra da Justiça
Agora - Vogal do CA da CGD 
 
José Silveira Godinho:
Antes - Secretário de Estado das Finanças
Agora - Administrador do BES 
 
João de Deus Pinheiro:
Antes - Ministro da Educação e Negócios Estrangeiros
Agora - Vogal do CA do Banco Privado Português.

 

Elias da Costa:
Antes - Secretário de Estado da Construção e Habitação
Agora - Vogal do CA do BES

 

Ferreira do Amaral:
Antes - Ministro das Obras Públicas (que entregou todas as pontes a jusante de Vila Franca de Xira à Lusoponte)
Agora - Presidente da Lusoponte, com quem se tem de renegociar o contrato.

Etc...etc...etc...  
  
O que é isto? Não, não é a América Latina, nem Angola. É Portugal no seu esplendor .

Cunha? Gamanço?  
E depois este ESTADO até quer que se declarem as prendas de casamento e o seu valor.

Já é tempo de parar! Não te cales, DENUNCIA estas «coincidências»!

Passa este texto; fá-lo circular.

publicado por negra às 18:33
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Terça-feira, 11 de Novembro de 2008

ERMELO A PAR DAS ATROCIDADES LICENCIADAS PELO MINISTÉRIO DO AMBIENTE

No passado sábado, dia 8 de Novembro, foi realizada uma sessão de esclarecimento na freguesia de Ermelo (Mondim de Basto) pelo «Movimento Cidadania para o Desenvolvimento no Tâmega», a propósito dos efeitos previsíveis, passíveis de antever, e que resultarão no Baixo Tâmega com a execução do «Programa Nacional de Barragens com Elevado Potencial Hidroeléctrico.


A convite da Junta de Freguesia de Ermelo (Mondim de Basto), no passado sábado (8/Novembro/2008), pelas 21 horas, desloquei-me à Casa do Povo da freguesia para apresentar à população as atrocidades que o «Programa Nacional de Barragens com Elevado Potencial Hidroeléctrico» comporta de nocivo para as comunidades do Tâmega, nomeadamente com o projectado transvase das águas do rio Olo. O convite chegou por via do Eng.º Alfredo Pinto Coelho e de Alfredo Gonçalves, membros do núcleo de Mondim do «Movimento Cidadania para o Desenvolvimento no Tâmega», presente em grande número, enquanto de Amarante se deslocaram também José Clemente e Rodrigo Oliveira.
Apesar do tempo pouco convidativo que se fazia sentir na encosta poente da serra do Alvão, a sessão esteve muito participada registando grande número de presenças e em questões colocadas à mesa.
Entre a informação prestada e as preocupações manifestadas pelos presentes no decurso da sessão, ficou muito claro que - um ano após o debate público ocorrido sobre essa famigerada falácia nacional inventada nas eléctricas, apadrinhada pelo Instituto da Água, I.P. (INAG)/Autoridade Nacional da Água e avalizada pelo Governo - a população de Ermelo nunca fora informada do que o «Programa Nacional de Barragens» para ela reserva directamente em privações e em desregulação das suas actividades agro-pastoris e do seu modesto quadro de vida rural, com o projectado transvase do rio Olo para alimentar os caudais na albufeira de Gouvães (Gouvães da Serra - Vila Pouca de Aguiar).
De acordo com o testemunho da Presidente da Junta de Freguesia (D. Maria da Glória Leite Nunes), até àquela data, apesar das diligências encetadas junto da Câmara Municipal de Mondim de Basto e do Parque Natural do Alvão, as respostas obtidas foram semelhantes: "nenhuma das entidades sabia de nada" (sic).
Aquilo que para todos nós - residentes no Tâmega, e conscientes dos efeitos esperados desse atentatório e ofensivo «Programa Nacional de Barragens» - é um absurdo, destrocam os patrões das eléctricas (EDP, S.A. e IBERDROLA, S.A.) em discursos de milhões, sem respeito pela vida de quantos na bacia do Tâmega já começaram a sentir dos efeitos do seu poder sedente e cego, e da farsante actuação, ordeira e submissa, do ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território, e do Desenvolvimento Regional e do seu inútil Instituto da Água, I.P./Autoridade Nacional da Água, rendidos à adjudicação bilionária do licenciamento, indiscriminado e mercenário, à captação e ao transvase das águas do Tâmega e do Olo.


José Emanuel Queirós

publicado por negra às 15:03
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Quarta-feira, 5 de Novembro de 2008

ALERTA!!

Afinal, o governo e a EDP preparam-se para antecipar a celebração do contrato relativo à construção da barragem de Fridão. Leia esta notícia do Marão Online no blogue Por Amarante Sem Barragens.

 

publicado por negra às 19:08
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Sábado, 1 de Novembro de 2008

SALVAR O TÂMEGA E A VIDA NO OLO - primeiros subscritores

CIDADANIA PARA O DESENVOLVIMENTO NO TÂMEGA

Duas semanas depois de um primeiro encontro informal realizado em Amarante a 11 de Outubro – da iniciativa de alguns cidadãos residentes na região que convergem na análise dos problemas estruturais e do cinzentismo que afectam os vários concelhos do Tâmega – ontem (25.Outubro.2008) ocorreu novo encontro que contou com cerca de 20 participantes naturais de Cabeceiras de Basto, Mondim de Basto e Amarante.

A partir da análise e da reflexão às problemáticas que a "Barragem de Fridão" vem colocar aos concelhos que irão ser afectados, em pessoas conscientes do estado das coisas nos seus municípios e na região, está a sedimentar a ideia da «cidadania para o desenvolvimento no Tâmega». Esse pode ser também o primeiro passo para ganhar lastro a ideia embrionária da solidariedade regional, e tomar corpo a criação de um movimento cívico regional capaz de perspectivar problemas concelhios comuns, de os analisar e de lhes dar tratamento público fora dos ensimesmados, sombrios e distantes redutos político-partidários, e do acabrunhamento em que têm lugar os habituais jogos paroquianos pela disputa do poder nos respectivos municípios.

É reconhecido que o quadro sócio-político deprimente que se impôs no Baixo Tâmega é devido, em grande parte, à falta de dinamismo que tem lugar na orientação de conduta dos municípios, a que não é inocente o ostracismo adoptado a partir da centralidade de Amarante, reconhecida como sede natural do Baixo Tâmega. Sem dinamismo nem laivos de qualquer iniciativa propulsora e polarizadora, os vários concelhos têm vindo a ganhar posição relativa de grande alheamento inter-concelhio e de incipiente cooperação municipal, como se constata dos resultados alcançados pelo associativismo municipal e urbano, e pelos obtidos pelo concurso empresarial do público-privado.

O palco para a construção deste cenário regional teve o seu tempo de realização e o seu «caldo» intra-concelhio, com os seus próprios protagonistas e o seu encadeamento de processos, numa exemplar conjugação de métodos bafientos em coerência de esforços e controlo. No seu conjunto, todos confluem e justificam o declínio sócio-económico e o vazio de liberdade experimentado nas rotinas de vida em cada um dos concelhos. Em última instância, globalmente, estas são algumas das causas para o empobrecimento progressivo registado e para a desconsideração colhida dos sucessivos Governos, no tempo presente em que o Baixo Tâmega aportou.

É caso paradigmático comum a todos os concelhos o que resulta da execução do «Programa Nacional de Barragens com Elevado Potencial Hidroeléctrico» (PNBEPH), onde a contrastar com os ruídos produzidos em Amarante pelo principal responsável autárquico, nos municípios de Basto vigora um silêncio cortante nos órgãos executivos e deliberativos.

Perante tal contexto regional, reconhecidos os efeitos nefastos e perversos que se são passíveis de antever no Baixo Tâmega pela retenção das águas dos rios Tâmega e Olo para exclusiva produção hidroeléctrica, esta segunda reunião de Amarante [ocorrida exactamente um ano após a discussão pública do «PNBEPH» na região do Norte] teve como único ponto da agenda a necessidade de uma tomada de posição pública, abrangente, sobre o processo que conduziu à adjudicação da concessão para a construção da Barragem de Fridão/«cascata do Tâmega» pelo Instituto da Água, I.P./Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional.

Desenvolvimento regional, ordenamento do território, respeito pelo ambiente e consideração pelos residentes no vale do Tâmega, pelo direito à segurança, à qualidade de vida e à Vida, é exactamente pelo que pugnam os cidadãos

Alfredo José Simões Pinto Coelho (Mondim de Basto),

Alfredo Manuel Dinis da Costa Gonçalves (Mondim de Basto),

Amadeu Clemente Teixeira (Amarante),

António Adelino de Jesus (Amarante),

António Augusto Parente da Costa (Mondim de Basto),

António Aurélio Macedo Patrício (Amarante),

AntónioJosé Cardoso da Costa (Amarante),

António Teixeira (Amarante),

Armando José Pereira Oliveira (Mondim de Basto),

Artur Teófilo da Fonseca Freitas (Amarante),

Francisco João da Costa Pinto (Amarante),

Joaquim José Macedo Teixeira (Amarante),

José Morais Clemente Teixeira (Amarante),

José Manuel da Silva Moura (Mondim de Basto),

Jorge Manuel de Sousa Costa (Amarante),

José Emanuel Mendes Pilroto Coimbra Queirós (Amarante),

Luís Rua Van Zeller de Macedo (Amarante),

Marco Filipe Vieira Gomes (Cabeceiras de Basto),

Mário Manuel Ribeiro Maia (Amarante),

Rodrigo Luís Monteiro de Oliveira (Amarante),

Valdemar Pinheiro Coelho de Abreu (Amarante),

Vítor Filipe Oliveira Gonçalves Pimenta (Cabeceiras de Basto).

 

Entretanto, foi criado um blogue oficial do Movimento. Visite-o!

 

rio Tâmega - Ponte de Arame entre Amarante e Celorico de Basto

 rio Tâmega (ponte de arame) - local da implantação da barragem

publicado por negra às 12:50
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Quinta-feira, 30 de Outubro de 2008

«MANIFESTO ANTI-BARRAGEM».

Conforme sugestão aventada no decurso da reunião de 25/10 (sede ADESCO-Amarante), quanto à conveniência de se colocar a circular em público uma petição que enfatizasse o conteúdo do «MANIFESTO ANTI-BARRAGEM», e tendo por base o próprio «MANIFESTO», o Dr. José Emanuel Queirós produzui o documento anexo, o qual servirá de ponto de partida para a dinamização de uma frente de combate contra a intenção de construção da barragem de Fridão e de todos os demais projectos a ela associados.

Comissão para a instalação do

Movimento Cidadania para o Desenvolvimento no Tâmega



 

PETIÇÃO

ANTI-BARRAGEM

SALVAR O TÂMEGA

E A VIDA NO OLO


 

Vale do Tâmega

(Cabeceiras de Basto / Mondim de Basto / Celorico de Basto / Amarante)

OUTUBRO 2008



 

PETIÇÃO ANTI-BARRAGEM

  1. Tendo por base o «Programa Nacional das Barragens com Elevado Potencial Hidroeléctrico» (PNBEPH), em Julho de 2008 o Instituto da Água, I.P. adjudicou a concessão de cinco barragens na área da bacia hidrográfica do Tâmega, todas a implantar a montante da cidade de Amarante.

  2. Ganhou actualidade a problemática da «cascata do Tâmega», que resulta do contrato para captação da água e construção da «Barragem de Fridão» (Amarante) à EDP, S.A. e da adjudicação das concessões para mais duas barragens no vale do Tâmega (Daivões e Vidago), e de outras duas em cursos afluentes (rio Beça – Padroselos, e rio Torno/Louredo – Gouvães) à eléctrica espanhola IBERDROLA, S.A..

  3. Este negócio da água para fins exclusivamente hidroeléctricos arrasta os cidadãos e o Baixo Tâmega para a fase terminal de um processo de implosão do vale e desregulação de toda a ordem sistémica natural, pela plena artificialização do Tâmega e retirada das condições ambientais propícias à existência e à Vida.

  4. O licenciamento à construção de mais cinco centrais hidroeléctricas na sub-bacia duriense do Tâmega, configura uma acção de alienação improcedente, de absoluta mercantilização dos caudais dos rios Tâmega e Olo, de desrespeito pelos valores da paisagem e dos ecossistemas ribeirinhos, de aviltamento do valor multidimensional do recurso da água, de sonegação das condições de segurança à vida no vale e da ordem natural da bacia.

  5. A barragem a edificar em Fridão será uma «grande» construção betonada implantada em pleno leito fluvial, interceptando e retendo as águas do rio Tâmega 6 quilómetros a montante de Amarante, a uma altura de 110 metros superior à cota de assentamento do núcleo histórico da cidade.

  6. O escalão hidroeléctrico de «Fridão» é o que mais directa e imediatamente afectará a secção média-inferior do Tâmega situada entre os territórios dos concelhos de Cabeceiras/Mondim, Celorico de Basto e Amarante, integrando o grupo de barragens de classe I pelos danos potenciais sobre a ocupação humana, bens e ambiente, associados à onda de inundação no vale a jusante.

  7. Pela construção de uma «grande» central hidroeléctrica em Fridão (Amarante), o Governo não pode e não deve colocar as pessoas no vale do Tâmega perante riscos induzidos, desmesurados e incomportáveis, submetendo uma das suas comunidades nacionais mais debilitadas a um contexto ambiental artificial deplorável.

  8. Igualmente nefasto será o transvase das águas do rio Olo (Lamas de Olo – Vila Real) para o rio Torno/Louredo (Gouvães da Serra – Vila Pouca de Aguiar), destinado a alimentar os caudais na barragem de Gouvães. Esta medida vai inviabilizar a monumentalidade natural da paisagem das «Fisgas» de Ermelo (Mondim de Basto), a «Zona de Pesca Reservada do Rio Olo», a agricultura e a moagem nas comunidades ribeirinhas, e a reactivação da Central Hidroeléctrica do Olo.

  9. Este cenário criado à região Tâmega constitui uma investida madrasta, cega, rude e brutal sobre recursos naturais e culturais do país. Recursos, esses, inalienáveis e vitais para o vale e toda a região Tâmega e para o seu debilitado estado sócio-económico, que são muito mais potencialidades locais e regionais do que nacionais.

  10. Valores multigeracionais e condições da própria Vida no Baixo Tâmega devem ser compreendidos pelo Estado (central) como perenes e vitais, incomensuráveis e inestimáveis do ponto de vista de alguma aferição económica, não podem se reconvertidos em nenhum cenário de desenvolvimento que tenha como consequência a sua própria destruição.

  11. Políticas públicas que reflectem falta de sensatez e respeito pela Vida neste plano local e regional, que alienam de forma irreversível os recursos naturais, a paisagem e o ambiente, que retiram a segurança e se constituem em ameaça às pessoas e à comunidade estarão sempre em desconformidade com a ordem de valores e de progresso que a civilização preconiza e persegue.

  12. As populações da região do Tâmega estão conscientes dos valores patrimoniais ambientais, sociais e humanos patentes na área da bacia, nomeadamente na secção do território compreendida entre os concelhos de Cabeceiras, Mondim, Celorico de Basto e Amarante, que serão inexoravelmente afectados pela execução do «Programa Nacional de Barragens com Elevado Potencial Hidroeléctrico».

  13. Por isso, exortam os órgãos de soberania do Estado Português:

  • à consideração pelos objectivos da Organização das Nações Unidas (ONU) consagrados na «Declaração do Milénio» quanto ao que a cada um dos estados-membros compete em «pôr fim à exploração insustentável dos recursos hídricos»;

  • à aplicação do «quadro de acção comunitária no domínio da política da água»;

  • à consideração da necessidade em «garantir um uso eficiente, racional e parcimonioso deste recurso», enquanto desígnio orientador da política de gestão da água em Portugal consagrado no «Programa Nacional para o Uso Eficiente da Água»;

  • ao cumprimento do quadro legal que estabelece «as bases e o quadro institucional para a gestão sustentável das águas», em concordância com o princípio do «desenvolvimento sustentável»;

  • à revisão das medidas em curso para gestão dos rios e dos recursos da água recaídas na bacia do Tâmega com o «Programa Nacional de Barragens com Elevado Potencial Hidroeléctrico»;

  • ao respeito pelas populações residentes no Baixo Tâmega e pelos valores presentes no território que a bacia comporta;

  • à manutenção da integridade do rio Olo, sem captação do seu caudal em Lamas de Olo (Vila Real) nem transvase para a barragem de Gouvães (Gouvães da Serra – Vila Pouca de Aguiar);

  • à retirada do escalão de Fridão (Amarante) do «Programa Nacional de Barragens com Elevado Potencial Hidroeléctrico»;

  • à anulação da concessão para captação de água e construção de uma barragem hidroeléctrica em Fridão (Amarante), atribuída à empresa Electricidade de Portugal, S.A. (EDP) pelo Instituto da Água, I.P./Ministério do Ambiente.

 

Pelo direito à vida no vale do Tâmega!

Pelo Tâmega livre da pressão das barragens!

Não ao transvase do rio Olo para a barragem de Gouvães!

Não à Barragem de Fridão, Sim ao desenvolvimento da Região!

 

publicado por negra às 01:22
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Sábado, 25 de Outubro de 2008

MANIFESTO ANTI-BARRAGEM (documento em análise)

Comissão para a instalação do
Movimento Cidadania para o Desenvolvimento no Tâmega
 
MANIFESTO ANTI-BARRAGEM
SALVAR O TÂMEGA E A VIDA NO VALE

Vale do Tâmega
(entre Mondim de Basto e Amarante)
OUTUBRO 2008
  
MANIFESTO ANTI-BARRAGEM
SALVAR O TÂMEGA E A VIDA NO VALE
 
Decorrido quase década e meia sobre os primeiros embates públicos com as iniciativas da EDP, S.A. para, em território português, submeter o rio e o vale do Tâmega aos desígnios da hidroelectricidade, em Julho de 2008 veio o Instituto da Água, I.P. adjudicar a concessão de cinco barragens na área desta bacia hidrográfica.
Retomado o propósito empresarial da construção de mais 10 «grandes»[1] empreendimentos hidroeléctricos no país, o Governo actualizou uma antiga problemática relativa à designada «cascata do Tâmega», há muito receada na região. Ela resulta não só do contrato para construção da «Barragem de Fridão» pela EDP, S.A., mas ressurge em toda a sua amplitude com a adjudicação à eléctrica espanhola IBERDROLA, S.A. da captação da água e construção de mais duas barragens no vale do Tâmega (Daivões e Vidago), e de outras duas em cursos afluentes (rio Beça – Padroselos, e rio Torno/Louredo – Gouvães). Ao todo, cinco «grandes» barragens a implantar a montante da cidade de Amarante.
Usando recurso ao designado «Programa Nacional de Barragens com Elevado Potencial Hidroeléctrico» (PNBEPH) o aparelho de Estado – pela acção concertada da Direcção-Geral de Energia e Geologia/Ministério da Economia e Inovação com Instituto da Água, I.P./Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional –, encontrou fundamento para dar sentido às velhas aspirações de crescimento empresarial pulsantes nos poderosos mercados produtores e transportadores de electricidade. Simultaneamente, com este negócio da água do Tâmega e de seus afluentes, os cidadãos e o Baixo Tâmega estão arrastados para a fase terminal de um processo mercenário, aviltante, de implosão do vale e desregulação de toda a ordem sistémica natural, pela retirada das condições ambientais propícias à existência e à Vida, que importa saber e levar em consideração.


O INSTRUMENTAL «PROGRAMA NACIONAL DE BARRAGENS»


Perante a «Avaliação Ambiental» do «PNBEPH» e dos concursos públicos subsequentes levados a efeito pela «Autoridade Nacional da Água»[2] (INAG, I.P.), ninguém pode deixar de constatar que este processo decisório usa recurso à plena artificialização do Tâmega e tem fins exclusivamente hidroeléctricos. Atendendo a esse objectivo, o «Programa» em execução assenta numa peça meticulosamente urdida em gabinete a partir de Lisboa, para dar sentido aos propósitos de crescimento empresarial que nas eléctricas eram tidos por desejáveis e definitivos muitos anos antes da realização do referido "estudo".
No entanto, a concessão dos licenciamentos recentemente atribuídos pela Autoridade Nacional da Água/Ministério do Ambiente para construção de mais cinco barragens hidroeléctricas na sub-bacia duriense do Tâmega, não leva em conta as classificações recaídas sobre o espaço regional e os recursos locais que vai afectar, nomeadamente:
Primeiro – O leito do rio Tâmega e toda a rede hidrográfica é «reserva ecológica nacional» (REN)[3];
Segundo – A Bacia Hidrográfica do Tâmega é «zona sensível»[4] em virtude de se «revelar eutrófica»;
Terceiro – O Plano de Bacia Hidrográfica do Douro[5] em vigor estabelece e classifica a sub-Bacia do Tâmega em:
a)     «ecossistema a preservar» – o «rio Tâmega desde  a confluência com a ribeira de Vidago até Mondim de Basto e principais afluentes: rios Olo, Covas e Bessa».
b)     «ecossistemas a recuperar» - o «sector superior: desde a fronteira até à confluência do rio principal com a ribeira de Vidago», e o «sector terminal: desde Mondim de Basto, confluência da ribeira de Cabresto, à confluência com o Douro».
Quarto – As cabeceiras do rio Olo, até à proximidade de Ermelo (Mondim de Basto) é «área classificada» do Parque Natural do Alvão, onde são proibidos os «actos ou actividades» de «captação ou desvio de águas»[6]. (Ainda que o PNBEPH, refira que a barragem de Gouvães «não afecta a integridade do SIC Alvão/Marão.» (sic), contempla o transvase do rio Olo para o rio Torno (albufeira de Gouvães).
Quinto – a Bacia do rio Tâmega é «zona protegida», conforme a Lei-Quadro da Água[7].
Sexto – sobre o vale do Tâmega recai a classificação de «corredor ecológico», na categoria de «zona sensível», no âmbito do Plano Regional de Ordenamento Florestal do Tâmega (PROF T)[8], por promover «a conexão entre áreas florestais dispersas, favorecendo o intercâmbio genético, essencial para a manutenção da biodiversidade».
Considerando o meio físico e os contextos ambientais e sociais do Tâmega para os quais as cinco barragens estão projectadas, torna-se evidente que o «Programa Nacional de Barragens» foi produzido para, politicamente, justificar a construção de 5 (cinco!) grandes barragens de uma assentada na bacia do Tâmega, e outras tantas onde no país há condições físicas e interesse económico na sua exploração. Para tanto escamoteia conhecimentos não desprezíveis da realidade que opera, daí resultando insuficiente caracterização das causas naturais originárias de todos os possíveis cenários de risco:
–         omite a pré-existência da cidade de Amarante e da localidade de Fridão;
–         ignora fundamentos geomorfológicos estruturais e estruturantes (condicionantes naturais); e
–         usa recurso ao impiedoso argumento de que «não há sobreposição a áreas classificadas».
Senão, perante o quadro legal da Água e segundo o conceito de «desenvolvimento sustentável» que o edifício jurídico tem por fundamento, como seria possível justificar ao país e à Europa da União a exploração exaustiva e massificada da água dos rios, as perdas patrimoniais efectivas locais e regionais, e os ganhos em privações ambientais e desarranjos biofísicos, insegurança e riscos para as pessoas, em particular no vale do Tâmega?
Tendo por referência o «Programa Nacional das Barragens com Elevado Potencial Hidroeléctrico», a conjuntura que o gerou e em que está a ser executado, o Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional passou a estar subordinado aos ditames da produção hidroeléctrica; o quadro legal define limites perfeitamente transponíveis; e a Autoridade Nacional da Água oferece provas insofismáveis de estar perfeitamente entrosada no processo. Mais apta a converter os recursos hídricos nacionais à luz dos interesses em presença do que na observância da lei e em concordância com os preconizados conceitos do «desenvolvimento sustentado», da «utilização eficiente» dos recursos hídricos nacionais, e da «gestão sustentável da água», por respeito à necessidade em «garantir um uso eficiente, racional e parcimonioso deste recurso» enquanto desígnio orientador «da política de gestão da água em Portugal», consagrado no «Programa Nacional para o Uso Eficiente da Água» (PNUEA)[9].


CONSEQUÊNCIAS DO «PNBEPH» PARA O TÂMEGA E O OLO


A adopção do «Programa Nacional de Barragens com Elevado Potencial Hidroeléctrico» pelo XVII Governo Constitucional vem determinar um momento conjuntural decisivo à vida no vale do Tâmega. Nomeadamente, impõe à região alterações induzidas despropositadas a partir da artificialização e descaracterização do caudal do rio e da paisagem do vale, e da desregulação dos regimes hídricos do Tâmega e seus afluentes, que se repercutirão directamente, de modo diferenciado, tanto na da vila de Mondim de Basto como na existência sobrevivente da cidade de Amarante.
A adjudicação do licenciamento bilionário à construção de cinco barragens hidroeléctricas na bacia do Tâmega, levada a efeito pela «Autoridade Nacional da Água», configura uma acção de alienação improcedente da Administração, de absoluta mercantilização dos caudais dos rios Tâmega e Olo, de desrespeito pelos valores da paisagem e dos ecossistemas ribeirinhos, de aviltamento do valor multidimensional do recurso da água, de sonegação das condições de segurança à vida no vale e da ordem natural da bacia. Assim será com a construção da barragem que a EDP, S.A. há mais de duas décadas tem projectada – em projecto! – para construir em pleno leito do rio, na freguesia de Fridão (Amarante).
A barragem a edificar em Fridão será uma «grande» construção betonada implantada em pleno leito fluvial, interceptando e retendo as águas do rio Tâmega 6 quilómetros a montante de Amarante, a uma altura de 110 metros superior à cota de assentamento do núcleo histórico da cidade. Das três grandes barragens adjudicadas para o vale do Tâmega, o escalão de «Fridão» é o que mais directa e imediatamente afectará a secção média-inferior do Tâmega compreendida entre os territórios dos concelhos de Mondim de Basto e Amarante, integrando o grupo de barragens de classe I[10] pelos danos potenciais sobre a ocupação humana, bens e ambiente, associados à onda de inundação no vale a jusante.
Por envolver predação de recursos e patrimónios inalienáveis, repercutindo inevitáveis reflexos locais e regionais na sociedade e no ambiente, igualmente nefasto será o transvase das águas do rio Olo (Lamas de Olo – Vila Real) para o rio Torno/Louredo (Gouvães da Serra – Vila Pouca de Aguiar). Esta medida contida no «Programa Nacional de Barragens», destinada a alimentar os caudais na barragem de Gouvães, será o bastante para inviabilizar a monumentalidade natural da paisagem das «Fisgas» de Ermelo, a «Zona de Pesca Reservada do Rio Olo»[11], a agricultura e a moagem nas comunidades ribeirinhas, e a reactivação da Central Hidroeléctrica do Olo.
Percebendo antecipadamente os desarranjos biofísicos, sócio-económicos, patrimoniais, psico-sociológicos e as privações que a artificialização causada pela construção das cinco projectadas barragens hidroeléctricas tenderão a introduzir em toda a extensão do vale e na bacia do rio Tâmega, estamos em condições de poder afirmar que este cenário criado à região Tâmega pelo XVII Governo Constitucional constitui uma investida madrasta, cega, rude e brutal sobre recursos naturais e culturais do país. Recursos, esses, inalienáveis e vitais para o vale e toda a região Tâmega e para o seu debilitado estado sócio-económico, que são muito mais potencialidades locais e regionais do que nacionais, cuja expressão máxima do seu valor reside nas comunidades humanas que lhe dão vida.


OS PODERES NA ABORDAGEM DA PROBLEMÁTICA


Durante cerca de 14 anos conveio que caísse um véu de silêncio sobre a problemática «Barragem de Fridão/cascata do Tâmega», prosseguindo junto das mais altas instâncias do Estado até ganhar a configuração com que hoje se apresenta à região. Presentemente, no vale do Tâmega estamos confrontados com decisões do Governo que reflectem uma confrangedora falta de conhecimento da realidade, e de verdadeiro posicionamento e empenhamento das diversas instâncias do Poder Local visando a salvaguarda da integridade dos respectivos patrimónios e a segurança das suas populações, que se configuram valores absolutos consagrados na lei.
Mais de um ano após as primeiras manifestações públicas de alerta sobre uma antiga problemática despoletada pela EDP, S.A. nos primeiros anos da década de 1990, quanto ao tratamento que o assunto mereceu da parte dos municípios, a realidade não podia ser mais esclarecedora: nem informação, nem esclarecimento, nem atitude perante a Administração, nem diligência alguma de assinalar. O mutismo que se apoderou das instituições municipais e o dilacerante vazio documental em que se arrastam não deixam de testemunhar a passividade, o imobilismo, o relaxe, a displicência ou o comprometimento com este processo de alienação que recaiu sobre a água, o rio, o vale e a bacia do Tâmega, e que virá a determinar a implosão da ordem ecossistémica do vale do Tâmega e o aviltamento definitivo da segurança das populações ribeirinhas.
Por força das suas competências em assegurar o cumprimento do Interesse Público local e regional, as entidades que mais deveriam estar inteiradas das consequências emergentes e disponíveis para informar os cidadãos, vivem desfasadas das realidades externas projectadas para a região, sugerem estar imbuídas de significativa falta de compreensão desta problemática e interesse pelas diversas abordagens possíveis, ou simplesmente gerem os desarranjos e as perdas passíveis de identificar previamente em conveniência de ocasião e compromisso de alguma ordem.
Com a construção de uma «grande» central hidroeléctrica em Fridão (Amarante), as repercussões internas esperadas na região, nomeadamente para Amarante, Celorico e Mondim de Basto – traduzidas em perdas patrimoniais irreparáveis, degradação da qualidade ambiental, e indução dos factores de insegurança –, o Governo não pode e não deve colocar as pessoas no vale do Tâmega perante riscos induzidos, desmesurados e incomportáveis, submetendo uma das suas comunidades nacionais mais debilitadas a um contexto ambiental artificial deplorável. Em busca de um melhor ambiente para o planeta, esta política governamental de fomento energético tem propósitos consideráveis para o país – mais ainda para as produtoras e transportadoras de energia – descoberto o filão argumentativo das “energias verdes” ou “renováveis”, mas estes são conceitos em que não se encaixa a energia hidroeléctrica obtida em grandes barragens à custa de tamanhas privações ambientais e humanas criadas às populações da bacia do Tâmega.
No contexto deste processo de alienação massiva, perverso, dos melhores recursos hídricos nacionais submetidos a fins exclusivamente hidroeléctricos, do património da paisagem do vale e da segurança das populações ribeirinhas do Tâmega, perante o quadro legal estabelecido a partir do conceito do «desenvolvimento sustentável» e da «gestão sustentável da água», o Estado de Direito não pode configurar uma instância de natureza insensível ou de dimensão imaterial.


RAZÕES PARA MOBILIZAÇÃO DAS POPULAÇÕES DO TÂMEGA


Para as comunidades do Tâmega, a aplicação destas políticas públicas do Governo – que reflectem uma indecorosa falta de sensatez e respeito pela Vida neste plano local e regional, que alienam dessa forma irreversível os recursos naturais, a paisagem e o ambiente, que retiram a segurança e se constituem em ameaça às pessoas e à comunidade – estarão sempre em desconformidade com a ordem de valores e de progresso que a civilização preconiza e persegue.
Deste modo, denunciamos:
–         o logro técnico recaído no «Programa Nacional de Barragens com Elevado Potencial Hidroeléctrico» adoptado pelo XVII Governo Constitucional, relativamente à bacia do rio Tâmega;
–         a subsequente falácia que consubstancia a produção do documento «Declaração Ambiental» sobre o «Programa Nacional de Barragens com Elevado Potencial Hidroeléctrico», subscrito pelo Presidente do Instituto da Água, I.P. (INAG) e o Director-Geral de Energia e Geologia;
–         o negócio dos rios e dos recursos da água de superfície pela Autoridade Nacional da Água/Ministério do Ambiente, com a concessão do licenciamento à captação de água e construção de cinco (5!) grandes barragens na bacia do Tâmega;
–         a alienação massiva da água na bacia do Tâmega para o fim exclusivo da hidroelectricidade;
–         a submersão e destruição definitiva da paisagem do vale do Tâmega construída pelo rio;
–         a artificialização e desregulação dos regimes hídricos do Tâmega e seus afluentes, na secção da rede hidrográfica situada entre os concelhos de Mondim de Basto e Amarante;
–         o transvase do caudal do rio Olo (Lamas de Olo – Vila Real) para a barragem de Gouvães (Gouvães da Serra – Vila Pouca de Aguiar);
–         a retirada da água do rio Olo a jusante da captação, condição sine qua non para a reactivação da Central Hidroeléctrica do Olo;
–         o atentado à integridade monumental da paisagem natural das «Fisgas» de Ermelo (Mondim de Basto), e à respectiva área classificada do Parque Natural do Alvão;
–         a destruição dos regadios e das condições naturais para a agricultura a e moagem tradicional no vale do rio Olo;
–         a implosão dos ecossistemas ribeirinhos;
–         a consequente degradação da qualidade das águas e do ambiente, com a transformação de meios lóticos em meios lênticos;
–         a insegurança por exposição subordinante a riscos gerados pela construção das barragens a montante, tendo por localizações sobreviventes a vila de Mondim de Basto e a cidade de Amarante.
As populações residentes na região do Tâmega estão conscientes dos valores patrimoniais ambientais, sociais e humanos patentes na área da bacia, nomeadamente na secção do território compreendida entre os concelhos de Mondim de Basto e de Amarante, que serão inexoravelmente afectados na sua integridade pela execução do «Programa Nacional de Barragens com Elevado Potencial Hidroeléctrico». São valores multigeracionais e condições da própria Vida no Baixo Tâmega que devem ser compreendidos pelo Estado como perenes e vitais, incomensuráveis e inestimáveis do ponto de vista de alguma aferição económica, não revertíveis em nenhum cenário de desenvolvimento que tenha como consequência a sua própria destruição.
Por isso, exortamos os órgãos de soberania do Estado Português:
–         à consideração pelos objectivos da Organização das Nações Unidas (ONU) consagrados na «Declaração do Milénio»[12] (capítulo IV – n.º 23 – alínea 4) quanto ao que a cada um dos seus estados-membros compete em «pôr fim à exploração insustentável dos recursos hídricos»;
–         à aplicação do «quadro de acção comunitária no domínio da política da água»[13], transposto para a ordem jurídica nacional ao fim de dois anos de incumprimento;
–         à reconsideração da necessidade em «garantir um uso eficiente, racional e parcimonioso deste recurso», enquanto desígnio orientador da política de gestão da água em Portugal consagrado no «Programa Nacional para o Uso Eficiente da Água»[14];
–         ao cumprimento do quadro legal em vigor que estabelece «as bases e o quadro institucional para a gestão sustentável das águas», em concordância com o princípio do «desenvolvimento sustentável», onde a norma jurídica[15] toma alicerce;             
–         à revisão das medidas em curso para gestão dos rios e dos recursos da água recaídas na bacia do Tâmega com o «Programa Nacional de Barragens com Elevado Potencial Hidroeléctrico», da responsabilidade do Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional;
–         ao respeito pelas populações residentes no Baixo Tâmega e pelos valores presentes no território que a bacia comporta;
–         à manutenção da integridade do rio Olo, sem captação do seu caudal em Lamas de Olo (Vila Real) nem transvase para a barragem de Gouvães (Gouvães da Serra – Vila Pouca de Aguirar);
–         à retirada do escalão de Fridão (Amarante) do «Programa Nacional de Barragens com Elevado Potencial Hidroeléctrico»;
–         à anulação da concessão para captação de água e construção de uma barragem hidroeléctrica em Fridão (Amarante), atribuída pelo Instituto da Água, I.P. (Autoridade Nacional da Água), à empresa Electricidade de Portugal, S.A. (EDP).
 
Pelo direito à vida no vale do Tâmega
 
Pelo Tâmega livre da pressão das barragens
 
Não à Barragem de Fridão, Sim ao desenvolvimento da Região!

 


[1] Regulamento de Segurança de Barragens (alínea a) – número 1 – artigo 2.º) – Anexo ao Decreto-Lei n.º 344/2007, de 15 de Outubro.
[2] Lei n.º 58/2005, de 29 de Dezembro (alínea a) – número 1 – artigo 7.º).
[3] Decreto-Lei n.º 93/90, de 19 de Março (Anexo I – alínea a) – número 2).
[4] Decreto-Lei n.º 152/97, de 19 de Junho.
[5] Decreto Regulamentar n.º 19/2001, de 10 de Dezembro (Parte VI – alínea n)).
[6] Decreto-Lei n.º 237/83, de 8 de Junho (alínea h) – número 1 – artigo 6.º).
[7] Lei n.º 58/2005, de 29 de Dezembro (artigo 4.º - alínea jjj).
[8] Decreto Regulamentar n.º 41/2007, de 10 de Abril (alínea b) – número 5 - artigo 10.º).
[9] Resolução do Conselho de Ministros n.º 113/2005, de 30 de Junho.
[10] Decreto-Lei n.º 344/2007, de 15 de Outubro (número 4 – Anexo ao Regulamento de Segurança de Barragens)
[11] Portaria n.º 206/2008, de 25 de Fevereiro.
[12] Resolução A/RES/55/2, de 8 de Setembro de 2000.
[13] Directiva n.º 2000/60/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Outubro de 2000.
[14] Resolução do Conselho de Ministros n.º 113/2005, de 30 de Junho.
[15] Lei n.º 58/2005, de 29 de Dezembro (artigo 4.º - alínea jjj).

publicado por negra às 01:12
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Quinta-feira, 16 de Outubro de 2008

Chefe da Comissão de Avaliação sai após 5 meses

"VOZ INCÓMODA" DEIXA AVALIAÇÃO NUMA FASE CRÍTICA

 

Conceição Castro Ramos aposenta-se quando se avaliam 140 mil

A presidente do Conselho Científico para a Avaliação dos Professores (CCAP), estrutura que supervisiona todo o processo de análise e
classificação do desempenho, aposentou-se. Uma decisão surpreendente, por acontecer precisamente numa altura em que as escolas estão a generalizar a avaliação a todos os 140 mil profissionais da área.

Conceição Castro Ramos, nomeada para o cargo pela ministra da Educação, Maria de Lurdes Rodrigues, no final de Novembro de 2007,
tomou posse já a 21 de Abril deste ano, acabando por deixar as funções ao fim de pouco mais de cinco meses.

Contactado pelo DN, o Ministério da Educação limitou-se a confirmar a saída da especialista e a informar que "está em curso" o processo de preenchimento do cargo. Já Mário Nogueira, secretário-geral da Federação Nacional dos Professores (Fenprof), não escondeu alguma surpresa com a decisão: "É no mínimo estranho que, tendo tomado posse há tão pouco tempo, a doutora Conceição Castro Ramos não tenha desejado, pelo menos, acompanhar o processo até ao final do ano lectivo".

Fazia críticas "incómodas"

De resto, o sindicalista questionou mesmo se a aposentação não se terá ficado a dever a posições críticas sobre a avaliação docente assumidas recentemente pelo CCAP. "Espero que a doutora Conceição Castro Ramos não se tenha aposentado por haver algum incómodo", disse.

E acrescentou: "Sabemos que, na última reunião do Conselho das Escolas, a senhora ministra da Educação revelou um incómodo muito
grande, porque as escolas citaram várias críticas do CCAP ao modelo de avaliação, como o facto de se poderem considerar os resultados dos alunos na avaliação do professor."

No discurso de tomada de posse, em Abril, a antiga inspectora-geral da Educação tinha anunciado ambições a prazo para o CCAP: "O conselho precisa de tempo para ter um pensamento estratégico de acção. Não significa descurar o curto prazo, mas não pode cingir-se ao imediato", disse na altura.

A avaliação de docentes do ano lectivo passado - na sequência de protestos que culminaram numa marcha nacional de 100 mil professores em Lisboa - cingiu-se a uma classificação experimental e simplificada, pelas escolas, de 12 mil professores, contratados ou quadros em ano de progressão na carreira.

 

In Diário de Notícias.

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Segunda-feira, 13 de Outubro de 2008

Em Movimento

Alguns estudantes do Colégio de São Gonçalo foram sensíveis à problemática das consequências da construção da barragem de Fridão e marcaram presença no largo de S. Gonçalo, no passado sábado, tendo dialogado com elementos do movimento cívico "Por Amarante Sem Barragens". A participação efectiva dos jovens num movimento cívico de oposição à decisão do governo é uma mais valia que se pode tornar decisiva na intenção de inverter o processo. A expectativa é, naturalmente, que o número de jovens interessados pelo tema e comprometidos com os rios Tâmega e Olo cresça e se afirme "como uma força que ninguém pode parar".

 

 

publicado por negra às 22:32
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Quinta-feira, 9 de Outubro de 2008

BARRAGEM? NÃO, OBRIGADO!

RECOLHA DE ASSINATURAS

 

No próximo Sábado, dia 11 de Outubro, o movimento cívico de oposição à construção da barragem de Fridão vai estar em S. Gonçalo, com o intuito de fazer uma recolha de assinaturas. Entre as 8 e as12 horas, será possível deixar a sua assinatura numa petição a entregar na Assembleia da República.

Se não puder estar presente, assine a petição on-line.

poramarantesembarragens.blogspot.com/

 

 Para: Assembleia da Repúlica

Sr Presidente da Assembleia da República.
Excelência

Considerando...
a forma cega e imponderada como o Programa Nacional de Barragens de Elevado Potencial, equacionou a barragem de Fridão, a cerca de 6 quilómetros (o mais próximo dos 5 empreendimentos hidroeléctricos a erigir a montante da cidade, englobados na designada cascata do Tâmega), já que os factores sopesados comparativamente a outras soluções, foram, fria e notoriamente, focalizados na área a inundar, como se o seu impacto, directo, e incontornável, sobre a cidade de Amarante, fosse desprezível.

Considerando ...que o programa minimiza ou escamoteia, que a barragem programada para Fridão, virá a repercutir-se-á de forma irreversível e devastadora na cidade de Amarante, a nível das condições de vida, da qualidade da água para consumo, do regime e amplitude das cheias e sua incidência na segurança dos residentes, da completa destruição do revestimento vegetal das margens e ínsua dos frades, das praias fluviais, dos percursos pedonais beira-rio, da descaracterização radical da paisagem, com a irreversível rotura do diálogo harmónico da moldura ambiental com o conjunto monumental e histórico da ponte e Igreja de S. Gonçalo - uma trilogia âncora de uma economia exclusivamente virada para o turismo - como se tudo isso fosse tara sem valor e de somenos importância.

Sem negar a relevância conjuntural dos recursos endógenos e das energias renováveis em toda a sua momentosa importância perante as questões ambientais, a incomportável factura energética e a nossa dependência dos combustíveis fósseis, esta insofismável realidade, não pode, nem deve, ainda assim, ser arvorada como um rolo compressor que leve de roldão, valores irresgatáveis e de uma hierarquia relativa sem precedentes, que não foram compaginados, por quem deliberadamente se virou de costas para os amarantinos,

Os cidadãos abaixo assinados, vêm solicitar a V. Ex.ª Sr. Presidente da Assembleia da República, que o sofisma em que assenta o estudo comparativo que destacou a barragem de Fridão entre 25 outras hipóteses consideradas, seja debatido na Assembleia de República por forma a remeter ao Governo um pedido da reformulação do Programa, de molde a integrar o peso relativo destes aspectos decisivos que foram minimizados, e deliberadamente preteridos, como tudo o que se insere a jusante da barragem e sobre a nossa cidade que foi pura e simplesmente eclipsada na ponderação relativa dos factores equacionados no conjunto das das 25 hipóteses ponderadas no Programa Nacional de barragens com Elevado Potencial Hidroeléctrico.

 

 

 

 


 

 

 

ENCONTRO DE JOVENS

 

A partir das 14 horas, haverá um encontro de jovens em S. Gonçalo, com o intuito de serem criados núcleos de um amplo movimento de sensibilização dos amarantinos para as graves consequências inerentes à construção da barragem de Fridão, de modo a envolvê-los numa manifestação de força que se oponha à decisão irresponsável do governo de patrocinar a construção das novas barragens no rio Tâmega.

 

Pelo Tâmega,

pelo Olo,

por Amarante,

por TI...

APARECE!

 

Não podemos permitir que, num futuro próximo, o encanto e a beleza da paisagem natural do rio Tâmega só possam ser contemplados na poesia, como é exemplo esta maravilhosa composição do amarantino Teixeira de Pascoaes.

 

A SOMBRA DO TÂMEGA

 

Minha santa janela, onde eu medito
E digo adeus ao sol e falo ao vento…
E saúdo a aurora e leio no Infinito
E sinto, às vezes, um deslumbramento!

Vejo, de ti, a Serra e aquele val’,
Onde aparece a imagem indecisa
Dum rio de águas mortas, espectral,
Que, entre sombrias árvores, desliza.

E vejo erguer-se o rio cristalino,
Transfigurado em sonho ou nevoeiro…
E faz-se eterno espírito divino
Aquele corpo de água prisioneiro.

Ó láctea emanação! Ó névoa densa!
Ó água aberta em asa! Ó água escura!
Água dos fundos pegos, no ar, suspensa,
Vestida, como um Anjo, de brancura!

Água gélida e negra, que te elevas,
Qual fantasma, no Azul, que desfalece!
Ó claro e heróico sol, que vence as trevas,
Porque será que, ao ver-te, empalidece?

Ó água d’além túmulo! Água morta!
Ó água do Outro Mundo! Aparições
De neblina, entre as trevas… Absorta
Paisagem povoada de visões…

E enchendo todo o espaço de esplendores,
De desmaios, de síncopes e mágoas,
Diluindo tudo em místicos alvores,
Ergue-se a sombra lívida das águas…

Quantas vezes, de ti, boa janela,
Eu lhe falo e a interrogo… E, com certeza,
A tua sombra, ó água, é irmã daquela
Que anda em meu coração, e é só tristeza…

Ei-la a pairar na humana solidão
Infinita da noite, quando as cousas
São quimérica e estranha emanação
De silêncios e névoas misteriosas…

Ei-la que paira, ouvindo a voz da lua,
E a voz louca do vento e as ansiedades
Das sombras, que, na terra branca e nua,
Parecem desenhar profundidades…

Ei-la a pairar nas trevas que em nós deixam.
Nas almas e nas pedras da lareira,
Os olhos lacrimosos que se fecham
E dão, em vez de luz, cinza e poeira…

Bem mais do que neste ar, que se respira,
Pairas na minha alma… E com teus dedos
De penumbra, arrebatas minha lira,
Ó Tâmega de sonhos e segredos!

E vais compondo versos de neblina
às árvores do monte, à dura frágua…
Elegias de orvalho à luz divina,
Endeixas de remanso e cantos de água…

E sobes, a voar… E, num sombrio
Gesto de asa, percorres as Alturas!
E molhas minha fronte, aéreo rio;
E, através dela, sonhas e murmuras…

Ó bendita janela, entre aas janelas,
Onde fala comigo a luz do luar,
E a claridade viva das estrelas
Que traz, e sangue, os pés de tanto andar!

Bendita sejas tu, ó sempre aberta
Sobre o meu coração e estes outeiros,
E esta noite fantástica e coberta
De espectros, de visões e nevoeiros!

 

Teixeira de Pascoaes

 

 

publicado por negra às 23:26
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Terça-feira, 30 de Setembro de 2008

BARRAGEM DE FRIDÃO - Progresso ou crime?

 Amarante é o único município da bacia hidrográfica do Tâmega que contesta a construção de uma barragem no seu território e consequentemente não aplaudiu o plano nacional de barragens apresentado pelo Governo. Câmara e Assembleia Municipal já aprovaram moções que contestam o plano do Governo de construir a barragem de Fridão, sobretudo por saber-se que a construção daquele equipamento implica a alteração da cota de exploração da barragem do Torrão, no troço final do rio Tâmega e a juzante da cidade de Amarante.
A luta travada por Amarante desde 1988 (ano em que o Torrão iniciou a produção de energia) contra a exploração da barragem à cota 65 – que teria como consequência a inundação das margens do rio e outras zonas ribeirinhas, bem como a Ínsula [Ínsua] dos Frades, pequena ilhota entre as duas pontes da cidade – voltou à ordem do dia e é isso que os dois órgãos autárquicos de Amarante e com toda a certeza a esmagadora maioria da sua população não podem desejar.
 
Armindo Abreu: Oposição pouco consistente


O presidente da câmara de Amarante, Armindo Abreu, aquando do anúncio do plano do governo, manifestou a sua intenção de lutar contra a barragem. Armindo Abreu referiu, então, que se opunha "frontalmente ao projecto do Governo" e recordou que os órgãos autárquicos – Câmara e Assembleia Municipal – sempre se opuseram ao empreendimento. "Não queremos a barragem", dizia, peremptório, o autarca socialista, confrontado com o interesse do governo em avançar com  diversos empreendimentos hidroeléctricos, nomeadamente os cinco anunciados para a bacia do Tâmega.
 

 


 

 
[Uma antevisão de Amarante no pós-barragens; imagem recolhida na cheia de 2001, a uma cota próxima de 65, o valor do projecto da albufeira do Torrão]
 
 
Em declarações ao Marão Online, o autarca considerou no início do processo "que uma albufeira, com águas paradas, só viria desequilibrar o ambiente na cidade, além de destruir o património paisagístico de Amarante", lembrando ainda a consequente degradação da água, por ficar estagnada, sem corrente, e até o perigo de a cidade ficar com um enorme depósito de água, a escassos 12 quilómetros a montante - uma imprecisão do presidente, pois a barragem fica a apenas 6 quilómetros.
Recorde-se que o armazenamento total de água em Fridão – cerca de 200 mil milhões de metros cúbicos de água, segundo os estudos preliminares do empreendimento – é mais do dobro do que armazena actualmente a barragem do Torrão.
Posteriormente, em declarações às rádios Renascença e TSF, Armindo Abreu reafirmou que Amarante não quer a barragem e que tudo fará para lutar contra o projecto.
A Assembleia Municipal, com todos os partidos de acordo, à excepção de um deputado do movimento de apoio a Ferreira Torres, também aprovou uma moção contra a construção da barragem.
Entretanto, o autarca disse recentemente ao Marão Online que já expôs a situação a vários deputados socialistas e também ao ex-presidente da câmara de Amarante, Francisco Assis, dando-lhes conta que se os governantes socialistas decidirem avançar com o projecto vão ter pela frente a oposição de uma população inteira e porventura da região do Baixo Tâmega.
Armindo Abreu não descartou também a hipótese de envolver o Presidente da República nesta luta contra a barragem, se o Governo insistisse na sua construção.
Entretanto, recorde-se que o plano nacional de barragens passou por uma fase de estudo do Impacte Ambiental, sendo que relativamente à bacia do Tâmega, o parecer é negativo, sobretudo pelo facto do rio correr sobre uma fractura sísmica muito sensível. Há ainda outros dados técnicos demasiado assustadores. Atendendo à distância da edificação a barragem com mais de 110 metros de altura (a 6 Km de Amarante), em caso de acidente, uma onda de cheia mais alta do que a Igreja de S. Gonçalo, demoraria apenas 5 minutos a chegar ao Arquinho. Soube-se também que o plano para a barragem de Fridão implica o desvio do caudal das Fisgas de Ermelo, isto é, deixa de haver as Fisgas e deixa de haver o rio Olo.

 

- Se não conhece a beleza do rio Olo, visite o seguinte endereço:

www.aquariofilia.net/forum/lofiversion/index.php/t43152.html

 

 

- Os amantes de canoagem não podem ficar indiferentes:

canoagem.users42.donhost.co.uk/videosonline/tamega.wmv
 

 


Outras barragens no Tâmega recebem aplausos
 
Os dois municípios de Basto localizados na área da eventual albufeira da barragem de Fridão não se pronunciaram ainda sobre o plano do Governo, e parece que não colocam objecções.
De facto, quer Celorico de Basto quer Mondim de Basto não devem sofrer impactes negativos de monta – além das graves consequências ambientais, nomeadamente devido à alteração do clima gerada pela enorme massa de água a criar pela albufeira – uma vez que o rio Tâmega não atravessa aglomerados urbanos importantes e até passa bastante desviado das sedes dos dois concelhos.
Bem diferente é a posição das comunidades situadas no troço inicial do rio, em território nacional, uma vez que o Tâmega nasce em Espanha, perto de Ourense.
Os autarcas e empresários do Alto Tâmega já aplaudiram a construção de barragens nos seus territórios, nomeadamente acerca dos empreendimentos de Vidago e Padrozelos.
considerandoas como "mais valias".
Fica a dúvida se estes autarcas sabem o que é desenvolvimento sustentável, se estão conscientes da factura que as próximas gerações irão pagar, se a troco de muitas promessas e alguns trocados valerá a pena hipotecar o futuro dos seus concelhos. Talvez pudessem esclarecer-se se estudassem o que aconteceu noutros projectos, noutros negócios semelhantes.

 

"Desastre ambiental",
alertam os especialistas
 
Entretanto, vários especialistas da área do ambiente já vieram a público alertar para o facto da cidade de Amarante correr o sério risco de sofrer um desastre ambiental, devido à elevada poluição do rio Tâmega, se a barragem de Fridão for transformada em aproveitamento reversível e ficar emparedada entre dois açudes e duas barragens.
Segundo Rui Cortes, professor da UTAD que tem colaborado em estudos de impacte ambiental de diversas barragens, nomeadamente Alqueva, Sabor e Foz Tua, afirma que o Tâmega é porventura o curso de água, dos rios internacionais, que apresenta maior grau de poluição, devido à eutrofização (formação de algas tóxicas).
Rui Cortes alegou ainda que se for construído um contra-embalse – açude a juzante da barragem para permitir a recolocação da água na albufeira principal durante a noite, aproveitando a energia das eólicas – a qualidade da água colocada no curso de água (caudal ecológico) será ainda de pior qualidade. Em vez de um rio, Amarante passará a ter um pântano de água choca e sem vida.
 
Blogue a pesquisar: http://poramarantesembarragens.blogspot.com 
 

As novas grandes barragens de que poucos falam

 

 

 Daivões, Gouvães, Padroselos ou mesmo Alto Tâmega são nomes que pouco dizem à maior parte das pessoas as quais, excepto no último caso, terão sérias dificuldades em localizá-los. Mas são quatro grandes barragens já aprovadas no âmbito duma das bandeiras de José Sócrates, designada com o pomposo nome de Programa Nacional de Barragens com Elevado Potencial Hidroeléctrico (PNBEPH). Programa esse que “visa tornar Portugal menos dependente das importações de energia”, do qual também fazem parte barragens mais conhecidas cuja polémica se tem prolongado, como é o caso de Fridão (Amarante) ou de Foz-Tua. Só que neste caso as coisas estão a avançar a passos largos, mas procurando não despertar demasiadas atenções.

Aquele conjunto de quatro barragens, designado por CASCATA DO TÃMEGA, foi recentemente concessionado à gigantesca IBERDROLA (de cuja direcção faz parte o ex-ministro Pina Moura, que definiu como governante as linhas mestras do programa energético do qual como empresário tirará o máximo partido…).

Os estudos de impacte ambiental irão já arrancar dentro de poucos dias. Ora bem, este conjunto de barragens, mais Fridão, irá mudar completamente o Tâmega e os afluentes mais importantes. E todas as povoações ribeirinhas. O Tâmega desaparecerá como nós o conhecemos, dado que desde a fronteira até Amarante será quase uma longa albufeira com cerca de 150 kms de comprimento.

Vamos a números para ter a noção da realidade:

Os aproveitamentos de Gouvães e Padroselos localizam-se em dois dos afluentes mais interessantes em termos ambientais. No primeiro caso, a barragem terá 36 m de altura e 173 de comprimento localizando-se no Rio Torno. Mas desviará ainda a água do rios Viduedo, Alvadia e Olo. As célebres cascatas das Fisgas de Ermelo poderão desaparecer e o próprio Parque Natural do Alvão será profundamente afectado.
No segundo caso, a barragem terá uma dimensão quase três vezes superior e será instalada no Rio Beça, o qual a par do Olo é um dos rios menos poluídos no Norte e o mais procurado para a pesca desportiva. Todavia, no caso do Rio Tâmega, não é propriamente a grande dimensão das barragens do Alto Tâmega e Padroselos que representa o factor crucial (terão alturas que se aproximarão dos 100 m e comprimentos no coroamento de cerca de 300 m): é a enorme área a ser abrangida pelas duas albufeiras, cujo comprimento de cada uma se aproxima dos 40 kms e que, consequentemente, irão submergir valores naturais e patrimoniais de grande significado, além de várias aldeias. Valores estes que serão destruídos de modo irreversível. Para quê? Repare-se que no caso do contestado Baixo Sabor, a produção energética corresponde apenas aos aumentos de consumo em ano e meio… Portanto um aproveitamento que irá destruir um rio com valores inestimáveis e que foi apresentado como algo de absolutamente imprescindível produz energia para os acréscimos observados… em pouco mais de 1 ano.

Mas este empreendimento não foi suficiente: surgiram logo depois da sua aprovação as 10 grandes barragens propostas no PNBEPH. Que também não serão suficientes, porque a estas seguem-se outras 10 a 13 a médio prazo, e que já estão inscritas no estudo inicial… É sustentável este desenvolvimento? Talvez para os empreiteiros a quem também não convém apostar na eficiência energética. Mas o agitar da bandeira das energias renováveis numa altura em que os altos preços do petróleo que tanto incomodam o cidadão comum vem no melhor momento. E o Governo sabe que esta é a altura melhor para vender o produto. Os grandes tubarões ibéricos que se movem nestas águas turvas agradecem…

Rui Cortes - Professor na UTAD
(4 de Setembro de 2008)

 

Barragens do Alto Tâmega vão afectar as Fisgas de Ermelo

 

 

A maior queda de água de Portugal - as Fisgas de Ermelo - localizada no Parque Natural do Alvão (PNA), poderá ser "seriamente afectada" com a construção da barragem de Gouvães. Este alerta foi feito nesta Quarta Feira à agência Lusa por Rui Cortes, professor na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) e especialista na área do ambiente.

Para Rui Cortes a construção de quatro barragens na bacia hidrográfica do Tâmega e de três derivações de cursos de água vão "alterar completamente" a área envolvente e mesmo o próprio PNA.

 

Segundo explicou à Lusa o especialista, a barragem de Gouvães, a construir no rio Torno, vai derivar água de dois afluentes, o Olo - na zona a montante das Fisgas - e Alvadia.

 

"Ou seja, o caudal que actualmente alimenta as fisgas será reduzido ao mínimo, afectando seriamente esta queda de água, que desaparecerá nos moldes em que a conhecemos actualmente, e o próprio PNA", sublinhou Rui Cortes.

 

Além da derivação do Olo, um canal com 7,8 quilómetros, a albufeira de Gouvães será ainda alimentada pela derivação de mais dois rios, o Alvadia (canal de 4,4 quilómetros) e o Viduedo (3 quilómetros).

 

Rui Cortes diz que não está a por em causa a construção da barragem, mas sim a derivação de água do Olo.

 

"A barragem não está em causa se não for concretizada esta derivação a partir do Olo", disse Rui Cortes que espera que esta situação seja resolvida em sede do Estudo de Impacte Ambiental.

 

O professor da UTAD diz ainda que a construção de quatro barragens vai transformar o rio Tâmega "praticamente numa grande albufeira" com cerca de 150 quilómetros, desde a fronteira até Amarante

 

(11 Setembro de 2008)

Um charco nauseabundo dentro da cidade?

 
A eutrofização é o fenómeno causado pelo excesso de nutrientes (compostos químicos ricos em fósforo ou nitrogénio, normalmente causado pela descarga de efluentes agrícolas, urbanos ou industriais) num corpo de água mais ou menos fechado, o que leva à proliferação excessiva de algas, que, ao entrarem em decomposição, levam ao aumento do número de microorganismos e à consequente deterioração da qualidade do corpo de água.
As principais fontes de eutrofização são as actividades humanas industriais, domésticas e agrícolas – por exemplo, os fertilizantes usados nas plantações podem escoar superficialmente ou dissolver-se e infiltrarem-se nas águas subterrâneas e serem arrastados até aos corpos de água mencionados. Ao aumento rápido de algas relacionado com a acumulação de nutrientes derivados do azoto (nitratos), do fósforo (fosfatos), do enxofre (sulfatos), mas também de potássio, cálcio e magnésio, dá-se o nome de "florescimento" ou "bloom" – dando uma coloração azul-esverdeada, vermelha ou acastanhada à água, consoante as espécies de algas favorecidas pela situação.
Estas substâncias são os principais nutrientes do fitoplâncton (as "algas" microscópicas que vivem na água), que se pode reproduzir em grandes quantidades, tornando a água esverdeada ou acastanhada. Quando estas algas – e o zooplâncton que delas se alimenta - começam a morrer, a sua decomposição pode tornar aquela massa de água pobre em oxigénio, provocando a morte de peixes e outros animais e a formação de gases tóxicos ou de cheiro desagradável. Além disso, algumas espécies de algas produzem toxinas que contaminam as fontes de água potável. Em suma, muitos efeitos ecológicos podem surgir da eutrofização, mas os três principais impactos ecológicos são: perda de biodiversidade, alterações na composição das espécies (invasão de outras espécies) e efeitos tóxicos…
(Wikipédia)

O fenómeno da eutrofização é já bem conhecido dos amarantinos mais atentos, ou que, de há uns anos a esta parte, mais de perto contactam, particularmente nos meses mais quentes de Verão, com as águas da albufeira da barragem do Torrão.
O aspecto esverdeado, dada a grande concentração de micro algas, já por diversas vezes encostou ao açude dos Morleiros e chegou mesmo a galgá-lo, em anos mais quentes e menos chuvosos.
O excesso de nutrientes associado à subida da temperatura das águas paradas, especialmente em locais de águas pouco profundas origina esse fenómeno do aparecimento das algas verdes e de cianobactérias (algas azuis) com efeitos nocivos para a saúde humana.
A construção das barragens e açudes, previstas no PNBEPH para montante e jusante de Amarante, provocará uma acentuada deterioração da qualidade da água do rio Tâmega e trará para dentro da cidade o aspecto que hoje já se pode ver na albufeira do Torrão e que as imagens retiradas do “Virtual Earth” tão bem documentam.


Imagens da albufeira da barragem do Torrão às portas de Amarante.

 

No site da  Amarante TV, há registos vídeo com Hugo Silva, deputado da Assembleia Municipal de Amarante, onde este reputado cidadão amarantino explica o que está em causa com a construção da barragem de Fridão, e há vídeos relativos ao debate público ocorrido no salão nobre da C. M. Amarante, com as intervenções do coronel Artur Freitas e do arquitecto Hugo Silva. Há ainda um registo vídeo relativo à palestra sobre a construção da barragem de Fridão, realizada em Abril de 2008, que teve como oradores o prof. Rui Cortes, a engenheira Berta Estevinha e o prof. Helder Leite.

 

Depois de entrar na página da Amarante TV, procure, na coluna do lado esquerdo, os vídeos clicando nos slides correspondentes. amarante.tv/index_in.html

 

Se é contra a construção da barragem de Fridão, divulgue este blogue junto dos seus amigos e familiares. O povo é quem mais ordena!

publicado por negra às 00:26
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Domingo, 21 de Setembro de 2008

Burlados pelo bem-estar

Já alguma vez te sentiste prisioneiro da tua vontade? Preso a uma vontade própria, que procura o prazer quotidiano e mundano, um prazer fácil, que se pode comprar, que não implica esforço, que não te acorda dessa letargia divina, enquanto a tua vida funciona a piloto automático, indiferente ao verdadeiro amor humano, obcecada pelas novas tecnologias, onde tanto a fala como o silêncio transgridem? Uma vontade que galhofa com as tuas prioridades, que as joga aos dados da sorte, viciados, onde, entre a família e o trabalho, é ininterruptamente a segunda opção que conquista o teu tempo?

 

Já alguma vez te sentiste preso a um comando remoto que te permite controlar o teu tempo, um comando que avança discussões, desce o volume do cão que incomoda, do bebé que chora, da criança que resmunga, do professor que barafusta, do tiroteio na casa do vizinho? Um comando que avança um capítulo infeliz de uma doença e te leva até à próxima promoção? Aquele comando maravilhoso que te transfere da escola para o hotel da vida, onde a única coisa que tens que fazer é ficar alapado e esperar que o criado faça, sirva, limpe, cozinhe, lave a boquinha, acenda o charuto, calce o chinelinho, leia o jornal (da bola), a revista (Maria). Aquele comando que te usurpa habilmente os anos que passaram despercebidamente, enquanto ansiavas a seguinte efémera felicidade. E, dás por ti e estás sozinho no hotel, rodeado de criados que te acrescentam à lista dos “burlados-pelo-bem-estar”.
As comodidades da vida provocam uma amnésia de valores, só as controvérsias que incitam a uma reflexão servem de remédio a esta maldita moléstia que afecta cada vez mais o ser humano.
«carpe diem»
                                                                                              Amália
publicado por negra às 17:20
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Sexta-feira, 11 de Julho de 2008

Português: más notas por culpa do exame

 

 
A quebra de resultados nos exames de Português do 12.º ano deveu-se "exclusivamente" a uma prova "duvidosa e mal formulada" e não à falta de preparação dos alunos, considerou esta segunda-feira a Associação de Professores de Português, escreve a Lusa.

"Os maus resultados não surpreenderam porque a prova apresentava toda uma série de questões mal formuladas que levaram os alunos à confusão. Esta quebra não se deve a falta do bom ensino de Português ou falta de preparação, mas sim exclusivamente à prova que os alunos tiveram à frente", afirmou à agência Lusa a vice-presidente da Associação de Professores de Português (APP), Edviges Antunes Ferreira.

A responsável lembrou que tanto o primeiro como o segundo grupo do exame de Português do 12.º ano "suscitaram várias dúvidas" à APP e a inúmeros professores, salientando que "nem os alunos nem os docentes podem ser responsabilizados pelos fracos resultados".

"Os professores leccionaram e preparam os alunos este ano como sempre o fizeram nos anos anteriores. Há uma coisa que está mal nisto tudo e de certeza que não é a forma como os professores leccionam o Português", reiterou.

A média de notas no exame de Português do 12.º deste ano ficou abaixo dos 10 valores (numa escala até 20) pela primeira vez em três anos, situando-se nos 9,7 valores face aos 10,8 de 2007.

Dos 60 281 alunos que este ano fizeram a prova de Português "chumbaram" 8 por cento (um acréscimo face aos 5 por cento verificados em 2007 e 2006).

A média de notas tem vindo a decrescer: dos 11,6 valores de 2006 passou-se para 10,8 valores no ano passado e para os 9,7 valores deste ano.

Edviges Antunes Ferreira afirmou ver "com bons olhos" o reforço das medidas de apoio da disciplina no Secundário anunciado pelo Ministério da Educação na sexta-feira passada.

"Quebra não é significativa"
O secretário de Estado Valter Lemos disse na sexta-feira à Lusa que "esta pequena quebra" nos resultados dos exames nacionais de Português do 12.º ano "não é muito significativa", mas é suficiente para "preocupar" o Governo, pelo que serão adoptadas "algumas medidas de apoio e de reforço no ensino de português no secundário".

Ainda que o resultado final não seja "um resultado muito mau", uma vez que "está no limiar da positiva", o secretário de Estado da Educação reconheceu que a baixa dos resultados a Português causa preocupação.

Diário Digital, 07-07-2008

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publicado por negra às 15:14
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Quarta-feira, 9 de Julho de 2008

Criancinhas

 

A criancinha quer Playstation. A gente dá.

 A criancinha quer estrangular o gato. A gente deixa.

A criancinha berra, porque não quer comer a sopa. A gente elimina-a da ementa e acaba tudo em festim de chocolate.

A criancinha quer bife e batatas fritas. Hambúrgueres muitos. Pizzas, umas tantas. Coca-Colas, às litradas. A gente olha para o lado e ela incha.

A criancinha quer camisola Adidas e ténis Nike. A gente dá, porque a criancinha tem tanto direito como os colegas da escola e é perigoso ser diferente.

A criancinha quer ficar a ver televisão até tarde. A gente senta-a ao nosso lado no sofá e passa-lhe o comando.

A criancinha desata num berreiro no restaurante. A gente faz de conta e o berreiro continua.

A criancinha, entregue aos seus desejos e sem referências, inicia o processo de independência meramente informal. A rebeldia é de trazer por casa. Responde torto aos papás, põe a avó em sentido, suja e não lava, come e não limpa, desarruma e não arruma, as tarefas domésticas são «uma seca».

Um dia, na escola, o professor dá-lhe um berro, tenta em cinco minutos pôr nos eixos a criancinha que os papás abandonaram à sua sorte, mimo e umbiguismo. A criancinha, já crescidinha, fica traumatizada. Sente-se vítima de violência verbal e etc e tal.

Em casa, faz queixinhas, lamenta-se, chora. Os papás, arrepiados com a violência sobre as criancinhas de que a televisão fala e na dúvida entre a conta de um eventual psiquiatra e o derreter do ordenado em folias de hipermercado, correm para a escola e espetam duas bofetadas bem

dadas no professor «que não tem nada que se armar em paizinho, pois quem sabe do meu filho sou eu».

A criancinha cresce. Cresce e cresce. Aos 30 anos, ainda será criancinha, continuará a viver na casa dos papás, a levar a gorda fatia do salário deles. Provavelmente, não terá um emprego, mas, pelo menos «não anda para aí a fazer porcarias».

Não é este um fiel retrato da realidade dos bairros sociais, das escolas em zonas problemáticas, das famílias no fio da navalha?

Pois não, bem sei. Estou apenas a antecipar-me. Um dia destes, vão ser os paizinhos a ir parar ao hospital com um pontapé e um murro das criancinhas no olho esquerdo. E então teremos muitos

 

congressos e debates para nos entretermos.

 

por Miguel Carvalho

artigo publicado na revista VISÂO online

 

 

 

publicado por negra às 17:27
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Sexta-feira, 4 de Julho de 2008

EDUCAÇÃO EM PORTUGAL: CONTRADIÇÕES E DISFUNÇÕES

 

 

«COMUNICAÇÃO AO IV CONGRESSO PORTUGUÊS DE SOCIOLOGIA

Agora que muito se fala de uma nova reforma curricular, é talvez a ocasião propícia para questionarmos, de novo, a natureza e o funcionamento do ensino em Portugal. Com décadas de reformismo a atravessar (e a minar) as políticas educativas, a distância entre as intenções proclamadas e os resultados continua a ser abissal. Se acreditarmos nas «paixões» dos nossos "decisores", a finalidade do sistema educativo seria proporcionar qualquer coisa como uma qualificação ao nível das habilitações médias capaz de colocar os portugueses no «pelotão da frente» em matéria de competitividade. Não me irei deter nas metáforas "atléticas" desta concepção de ensino, nem no cálculo economicista a que este discurso pretende reduzir o conceito de educação.

Há um fenómeno que torna essa análise irrelevante. E esse fenómeno é o facto de o nosso sistema de ensino parecer deliberadamente orientado para produzir exactamente o contrário daquilo que os sucessivos governos proclamam. Isto é: o contrário do famigerado «sucesso escolar», quer ele seja entendido na acepção neoliberal dominante, quer na versão igualitarista da «escola de massas».


Atingiu-se um ponto de saturação em que já ninguém acredita nas «paixões» pela educação. Mas, curiosamente, esse cansaço não produz qualquer revolta. Existe antes uma cumplicidade generalizada com as inércias do sistema educativo. Na verdade, um estranho consenso, feito de silêncio ou de indiferença, abateu-se recentemente sobre a reflexão crítica em torno do ensino em Portugal, como se, de repente, o «guterrismo» nos tivesse colocado no melhor dos mundos possíveis. As contradições e as disfunções, porém, permanecem bem evidentes nas escolas portuguesas, nenhuma «paixão» as erradicou por milagre, e é isso que torna necessário reactivar, aqui e agora, uma teoria crítica do ensino em Portugal.


Nesta comunicação, procuro identificar as contradições que me parecem nucleares no sistema educativo português, bem como os efeitos disfuncionais que delas resultam. São, antes de mais, hipóteses de trabalho que eu aqui levanto, baseadas em mais de dez anos de actividade lectiva no ensino secundário, repartidos por várias regiões do país e por alguns milhares de alunos. Esclareço ainda que sou professor de Introdução à Filosofia, disciplina que constitui um laboratório privilegiado para observar boa parte das disfunções a que me irei referir.


1. IDEOLOGIA «ILUMINISTA» VS. IDEOLOGIA DAS «NOVAS PEDAGOGIAS»


A primeira grande contradição que, em meu entender, interessa destacar não é uma originalidade portuguesa. Pelo contrário, ela reflecte a dependência do nosso país em relação aos centros de produção ideológica. De facto, nos últimos vinte anos Portugal tem partilhado com os países centrais europeus e os Estados Unidos uma contradição entre duas ideologias do ensino que coabitam a instituição escolar:


• A primeira, apelidá-la-ei de «iluminista». Segundo ela, a função da escola consiste em emancipar o género humano mediante a criteriosa administração do saber – da ciência –, o que desde logo pressupõe a sua democratização, ainda que parcelar e controlada. Semelhante ideal baseia-se nas seguintes convicções:
- A razão é a coisa mais bem distribuída do mundo, mas poucos a sabem usar.
- Os seres humanos não são naturalmente curiosos, e preferem a segurança da crença e do preconceito ao desconforto da crítica e da verdade.
- A ignorância constitui o estado natural e primitivo da consciência.
- Aprender é um acto anti-natural, que tem de ser imposto.


Este programa pedagógico apareceu assim dominado por uma representação vertical-disciplinar do ensino, ecoando à distância o mito platónico de uma «dialéctica ascendente» (a educação concebida enquanto forma de disciplinar as pulsões e como rito de passagem, com a correlativa transição do nível inferior para o superior, das "trevas" para a "luz", e a superação de obstáculos, a sujeição às provas e aos consequentes rituais de dureza). Por isso, semelhante ideologia, embora teoricamente igualitária, incluiu uma exigência de selectividade: já que o processo educativo é árduo, a ignorância renitente, a inculcação do saber dolorosa... nem todos passarão. Democrática, a substância da escola seria, em derradeira instância, meritocrática.


Em Portugal, a pedagogia «iluminista» constitui um caso de «globalismo localizado» , de raiz franco-germânica. Por cá chamou-se «positivismo» e foi consagrado com o advento da primeira República, quando ao objectivo da emancipação pelo saber se associou o projecto de fazer das crianças «bons portugueses» (tradução nacional-republicana para «bons cidadãos») . Com o salazarismo, deu-se o colapso de todo este programa: doravante, os «bons portugueses» precisavam apenas de saber ler, escrever e contar (ou nem isso). Colapso parcial, entenda-se, pois a ideologia «iluminista» não faleceu aí, como não desapareceu por completo nos dias de hoje: ela é matricial e indissociável dessa entidade moderna a que chamamos «escola». Entre nós, o seu último rebento mais notório terá sido a «Reforma Veiga Simão», dando ao «iluminismo» pedagógico um cunho «desenvolvimentista» e «tecnocrático» que ainda hoje aflora no discurso oficial de uma educação para a «competitividade».


• A outra ideologia, simultaneamente antagónica e complementar da primeira, é a das «novas pedagogias», desenvolvidas sobretudo ao longo dos anos 60 como reflexo da emergência de novos movimentos sociais, da crítica radical das instituições e da experimentação política próprias desse período. O discurso pedagógico "renovado" não só denunciou o programa «iluminista» como ideológico – isto é, como cobertura para as assimetrias sociais que o ensino supostamente confirma e reproduz –, mas também se opôs ao seu conteúdo ideal, particularmente no que toca à representação vertical-disciplinar do ensino. Contra esta imagem, as «novas pedagogias» afirmaram duas grandes convicções:
- As crianças e os jovens são naturalmente curiosos, criativos e sequiosos de aprendizagens.
- A escola pode e deve ser um espaço de prazer.


Daí foi extraída uma imagem alternativa, que designarei por representação horizontal-lúdica do ensino, caracterizada pelos seguintes tópicos:
- O ensino deve estar «centrado no aluno», não o tratando como receptáculo passivo da transmissão de informações, mas indo ao encontro das suas «necessidades» e «desejos», de maneira a integrar os conhecimentos de que ele é, desde o início, um suposto portador .
- O papel do professor não é o de um transmissor do saber, mas o de um mero catalisador e organizador da «curiosidade» e da «criatividade» dos alunos, tendo o cuidado de nunca lhes propor uma ruptura com o contexto social em que estão mergulhados .
- O objectivo primordial da escola não é avaliar conhecimentos nem seleccionar com base nessa avaliação, mas sim propiciar as condições para o «sucesso educativo integral» (de que a dimensão cognitiva é apenas uma parte, e não a mais importante) .


Esta ideologia tornou-se oficial e dominante após o 25 de Abril, percorrendo todos os documentos de carácter pedagógico emanados do Ministério da Educação (independentemente da cor política de quem ocupa a cadeira do ministro). É outro exemplo de um «globalismo localizado», desta feita de extracção anglo-saxónica, mas também francesa. Podemos dizer que ele está para a segunda República como o iluminismo positivista esteve para a primeira.


Sucede que a coexistência destas duas ideologias no sistema escolar tem contribuído para a indefinição dos objectivos e para a produção de políticas mutuamente exclusivas: por um lado, submetem-se os alunos a um processo de avaliação dos conhecimentos cujo fim último é classificá-los e seriá-los de acordo com critérios selectivos (em conformidade com a ideologia «iluminista»); por outro lado, são culpabilizados os professores que atribuem classificações negativas em número considerado excessivo, agitando-se o critério de um sucesso educativo incompatível com a hierarquização dos resultados obtidos pelos estudantes (e existe uma bateria formal de pessoas, de práticas e de instituições – inspectores do Ministério, Escolas Superiores de Educação, acções de formação – encarregues de apontar essa culpa, em conformidade com a ideologia das «novas pedagogias» ).


O diferendo entre as duas ideologias é estrutural e afecta o funcionamento de todo o sistema educativo: a das «novas pedagogias» impregna quase por inteiro o percurso da escolaridade obrigatória – onde o peso dado à transmissão dos saberes e ao desempenho cognitivo é diminuto e a selectividade se vê reduzida ao mínimo, com a prática generalizada da «passagem automática» –, para depois ceder o lugar às exigências da ideologia «iluminista» ao longo dos três níveis do secundário – aqueles em que as "boas intenções pedagógicas" têm de se curvar às "duras realidades" da filtragem, impostas pela exiguidade da rede de ensino superior e pela retracção do mercado de trabalho. Essa cedência nunca é aberta e assumida: aparentemente, as «novas pedagogias» continuam a imperar nos textos programáticos do Ministério da Educação e nas pressões exercidas sobre os instrumentos de avaliação que herdámos do «iluminismo» pedagógico. Todavia, embora diminuída e cercada, a ideologia «iluminista» sobrevive nos três anos do ensino secundário, já que, como veremos, ela responde a um objectivo inestimável das políticas educativas: classificar, seriar e filtrar, continuam a ser desígnios do sistema de ensino, mesmo que praticados de forma mais ou menos envergonhada.


Entretanto, o predomínio das «novas pedagogias» na escolaridade básica tem-se traduzido na quase total impreparação dos alunos para enfrentarem os requisitos do ensino secundário . A descontinuidade entre os dois graus de ensino deve-se, em grande medida, à impossibilidade de harmonizar regimes (e ideologias) de avaliação completamente opostos: uma avaliação predominantemente «formativa» na escolaridade obrigatória e uma avaliação quantitativa e hierarquizante no secundário. O império da «avaliação formativa» no ensino básico constitui uma pressão para que as práticas educativas se transformem «radicalmente»: é o triunfo da oralidade sobre a escrita, o colectivismo pedagógico (a obsessão pelos trabalhos de grupo), a relativização dos conteúdos lectivos (imersos numa espécie de debate permanente que facilmente os reduz ao estatuto de simples «opiniões») e a redução do papel do professor ao de um animador cultural . A minha hipótese é que esta contradição maior entre a escolaridade básica e o nível de ensino pré-universitário é deliberada e visa reforçar determinados efeitos de poder, a que aludirei mais adiante.


Concluindo este ponto, direi que em Portugal a ideologia das «novas pedagogias» serve, acima de tudo, três propósitos: seleccionar, não os alunos, mas os professores (ela comanda actualmente todo o processo de formação profissional dos docentes, obrigados a fazer prova de "boa consciência pedagógica", «aberta» e «inovadora» quanto baste), facilitar a transição dos alunos durante os ciclos da escolaridade obrigatória – servindo assim a demagogia "educativa" do poder político –, e, finalmente, compensar simbolicamente os índices de insucesso escolar do secundário, mediante uma cosmética de auto-culpabilização do sistema educativo. Como essa ideologia percorre todos os ciclos de escolaridade, ainda que numa contradição surda com a ideologia «iluminista», podemos dizer que ela é hegemónica no discurso e na prática pedagógicos. Trata-se, contudo, de uma hegemonia limitada e muitas vezes inconsequente: dada a rede de contradições e de subordinações em que vive mergulhada, a influência das «novas pedagogias» está longe de assumir um poder absoluto.


Esta contradição entre a ideologia «iluminista» do ensino e a ideologia das «novas pedagogias» tem sido interpretada, por quem defende a última, como uma tensão entre um paradigma meritocrático, recuperado pelo neoliberalismo, e um paradigma igualitário, supostamente mais democrático e emancipatório . Não me irei pronunciar, por agora, sobre este juízo de valor (mais à frente, deter-me-ei nele). No ponto em que estou, interessa-me antes salientar que, ainda que o programa ideológico do neoliberalismo pareça empenhado em introduzir a selectividade e a meritocracia nas escolas, esse objectivo, em Portugal, é coarctado pela contradição entre as ideologias que coabitam no ensino: o modelo selectivo está longe de se impor, já que a selecção é sistematicamente nivelada por baixo (basta ver como o ensino superior aceita estudantes com classificações negativas); e o modelo igualitarista esbarra nas exigências de seriação e de classificação que reaparecem durante os três anos do ensino secundário. O corolário de tudo isto é que nenhuma ideia minimamente coerente de educação preside ao sistema escolar que temos.


2. IDEOLOGIAS DO ENSINO VS. CONDIÇÕES MATERIAIS DO ENSINO


A segunda contradição nuclear da escola dá-se entre as ideologias do ensino e as condições materiais em que este se desenvolve. O discurso oficial insiste na optimização das potencialidades intrínsecas dos alunos – cuja medida se reduz, aliás, às percentagens de classificações positivas atribuídas (dessa forma incorrendo na contradição ideológica atrás referida). A verdade, porém, é que as escolas e os agentes educativos não dispõem de meios materiais e humanos necessários à prossecução dessa finalidade, por contraditória que seja. Desdobremos, uma vez mais, a lista: os estabelecimentos de ensino dos ciclos básicos e do secundário – mas também poderíamos acrescentar boa parte das universidades – são exíguos para a quantidade de jovens que a eles afluíram com a democratização do acesso e com o alargamento da escolaridade obrigatória, o que leva à sobrelotação das turmas. Por outro lado, as escolas estão desprovidas de equipamentos didácticos (faltam bibliotecas, laboratórios, pavilhões gimnodesportivos, meios mediáticos e informáticos), para já não falar de condições mínimas de habitabilidade (salas inestéticas, sufocantes no Verão e muitas vezes chuvosas no Inverno); o número de «auxiliares da acção educativa» é frequentemente escasso e as direcções das escolas enfrentam enormes dificuldades para a sua contratação, limitados como estão por dotações orçamentais estreitas. A lista poderia continuar, engordada por histórias surrealistas .


Nos países centrais em que se observa esta contradição, os governos neoliberais têm-na utilizado para reforçar a rede do ensino privado à custa da pauperização do ensino público. Uma estratégia que, aliás, reflecte bem o papel das ideologias pedagógicas, quando politicamente articuladas com as condições materiais do ensino. Assim, nas escolas do sector público, associa-se a miséria dos investimentos ao domínio das «novas pedagogias», empenhadas em evitar qualquer situação de prova que possa "ferir" o ego dos alunos. A anos-luz do propósito emancipatório dessas pedagogias, a associação das duas tendências que acabei de referir tem tido um único efeito notório: nivelar por baixo as competências escolares dos que frequentam o ensino público. Para as escolas privadas fica então reservada a conjugação das boas condições materiais para a prática educativa com os padrões de exigência próprios do «iluminismo» pedagógico.


Em Portugal, onde o número de escolas particulares é pouco significativo – sobretudo no que respeita aos 2.º e 3.º ciclos do básico e ao secundário –, esta manobra tem sido aplicada no ensino superior, deixando as universidades estatais a braços com uma crise financeira sem precedentes e alimentando, ao mesmo tempo, a proliferação de instituições privadas, ainda que de qualidade duvidosa.


3. IDEOLOGIAS DO ENSINO VS. OBJECTIVOS POLÍTICOS DO PODER CENTRAL


A terceira contradição opõe, e simultaneamente subordina, as ideologias do ensino aos objectivos políticos do poder central. Trata-se de uma relação complexa. Das considerações anteriores, talvez já se tenha inferido que são as políticas governamentais a dirigir cada uma das ideologias contra a sua rival, entroncando-se ora numa, ora noutra, em função de finalidades distintas. Deste modo, a ideologia «iluminista» é eclipsada sempre que entra em colisão com os seguintes objectivos políticos:
- "Armazenar" as crianças e os jovens nos estabelecimentos de ensino, mantendo-os ocupados enquanto os pais trabalham e assegurando, ao mesmo tempo, a sua transição "suave" de ano lectivo para ano lectivo (objectivo incompatível com o rigorismo selectivo da ideologia «iluminista»).


- Apresentar indicadores de sucesso escolar traduzíveis num reduzido número de reprovações, operação de marketing político com dois endereços: o dos destinatários internos – as famílias que importa tranquilizar a troco dos seus favores eleitorais –, e o dos destinatários externos – os organismos da União Europeia, junto dos quais interessa promover a miragem de um «Portugal de sucesso». Indiferente às reais competências dos alunos, a propaganda exige a renúncia à avaliação das mesmas.


O apoio institucional que a ideologia das «novas pedagogias» tem recebido encontra a sua explicação no aparente afã com que o Ministério da Educação zela pela efectivação dos dois objectivos acima mencionados. Mas o papel dessa ideologia acaba por ser puramente cenográfico: oferecer um duplo falseado das práticas instituídas, das relações reais e das carências que caracterizam o sistema de ensino. Com efeito, os diferentes textos publicados pelo dito Ministério (legislação, introduções aos programas das várias disciplinas, orientações para a sua aplicação, edições do Instituto de Inovação Educacional, etc.) encenam uma escola idealizada, onde tudo estaria a decorrer no melhor dos mundos em harmonia com o modelo horizontal-lúdico das «novas pedagogias». Deste modo, um discurso pedagógico que se pretende emancipador é facilmente colocado ao serviço de uma mistificação com fins reguladores. Por ser o mero revestimento de uma realidade esquelética, esta ideologia vê-se facilmente destituída quando nos deslocamos do "paraíso" do ensino básico para a política dominante no ensino secundário:


- Atribuir aos alunos classificações que funcionem como signos de promoção ou despromoção social, a fim de os distribuir por categorias cuja segmentação reproduz (e antecipa) os vários patamares do mercado de trabalho, filtrando ao mesmo tempo o seu ingresso no ensino superior.


Dá-se então o «retorno do recalcado»: tendo saído pela porta dos fundos, a ideologia «iluminista» regressa nos níveis correspondentes ao ensino secundário, ou seja, nos anos terminais de um percurso escolar "normal" (sendo "normal", no nosso país, não prosseguir os estudos). É, como já disse, um retorno denegado, pois nos textos oficiais continua a circular o discurso libertário das «novas pedagogias». E, nesse movimento, também a ideologia «iluminista», com a sua ênfase nas competências cognitivas, fica reduzida a uma função meramente regulatória. Se, após a permissividade do ensino básico, se redescobre o "rigor" apenas nos três últimos níveis do secundário , é a própria exigência da pedagogia «iluminista» que se vê assim esvaziada e instrumentalizada.


4. IMAGEM MODERNA DA ESCOLA VS. CONDIÇÃO PÓS-MODERNA


Finalmente, a última contradição dá-se entre a imagem moderna da escola e a condição pós-moderna emergente. De uma maneira ou de outra, as duas ideologias referidas participaram da modernidade, dado que ambas constituem verdadeiras «narrativas de emancipação», o pólo «iluminista» centrado na sacralização do saber e do mestre, e nas suas virtualidades "iluminativas", o pólo das «novas pedagogias» confiante na autonomia emancipatória de todo o sujeito-alvo do processo educativo. E ambas pressupõem uma certa temporalidade escolar: o tempo longo, o tempo da apropriação gradual dos saberes, o tempo da «ruminação» (para usar uma metáfora nietzschiana) inerente à actividade reflexiva, ou ainda o tempo pessoalizado a vários ritmos, o tempo em que cada um ensaia as suas capacidades e os seus limites. Ora, esta temporalidade do tempo longo, o da progressão – as duas ideologias são, convém lembrá-lo, eminentemente progressistas –, constitui hoje uma ilha, cada vez mais ínfima, no meio de temporalidades desconexas, efémeras, velozes a ponto de se tornarem voláteis. Perfazendo uma temporalidade outra, a que chamarei pós-moderna, elas cercam hoje a escola por todos os lados e preparam-se para invadir a sua própria substância.


Neste fenómeno interveio fortemente o devir contemporâneo da globalização. Antes de mais, a globalização comunicacional. É sabido como a vertiginosa rapidez dos contactos à distância, a anulação do tempo na instantaneidade com que nos ligamos (ou temos a ilusão de nos ligar) ao mundo inteiro, a circulação instantânea de quantidades maciças de informação facultadas pelos mass-media, pelo correio electrónico e pelas redes informáticas, localizaram a comunicação na sala de aula – uma comunicação simplesmente presencial, e cuja interactividade é apenas interpessoal. Essa localização foi ainda reforçada pelo contraste entre, por um lado, a temporalidade que articula a comunicação escolar e, por outro, a temporalidade mediática, com a sua sucessão de mensagens que persistem em nós apenas enquanto durar o espectáculo.


Os efeitos de tal localização são diversos e atingem, simultaneamente, os actores do processo educativo e as ideologias que pretendem sustentá-lo. Comecemos por analisar o que sucedeu aos actores:


- A autoridade magistral do professor foi completamente dessacralizada, a par da descanonização do saber de que ele é o suposto guardião. Essa erosão avançou em duas frentes:
* a da massificação populacional nas escolas, quer de alunos, quer de docentes, que retirou ao professor qualquer aura ou carisma (ele é somente mais um, no meio da massa – um efeito ainda moderno, já que resulta da exigência de democratização do ensino);
* mas também a de uma ludicidade que tende a nivelar, por meio do riso e da descontracção, tudo o que tenha pretensões a ser importante (e este é um efeito tipicamente pós-moderno).


- Os jovens que chegam à escola são já os mutantes da pós-modernidade. Desconto o que possa haver de impressionista e de redutor nesta generalização, salvaguardando todas as excepções que não caibam na etiqueta «os jovens». Feita esta ressalva, parece razoável afirmar que o psiquismo sensório-perceptivo daqueles, modelado pela descodificação dos novos produtos mediáticos (jogos de computador, video-clips, todo um universo de relações céleres entre o som e a imagem), colide frequentemente com o contexto temporal em que se desenrola a comunicação escolar: a atenção dos jovens é flutuante, ao passo que a escola requer uma concentração demorada; os jovens interiorizam os imperativos do consumo, enquanto a escola ainda acredita nas virtudes da fruição; os jovens são impacientes (de uma impaciência que não chega a ser reivindicação do futuro, mas somente intolerância para com a demora), ao passo que a escola reclama a «paciência dos conceitos». Dir-se-ia que este psiquismo reflecte um dos grandes paradoxos contemporâneos: no momento em que a globalização das redes comunicacionais parece criar as condições para um compromisso do ser humano com o mundo inteiro, dá-se, afinal, uma retirada estratégica da mente, que liga, desliga, olha e ouve, mas sem absorver. Defesa psíquica contra as quantidades maciças de informação que nos assaltam, mas também indiferença, desatenção, silenciamento da solidariedade. A aldeia global desmultiplica-se em encasulamentos. E daqui provém essa imensa falta de memória que os professores surpreendem nos jovens: não apenas uma ausência de memória cultural ou histórica, indispensável a qualquer relação produtiva com o presente, mas da própria função mnésica, que em muitos alunos parece sofrer um inquietante bloqueio .


Não é difícil calcular os "estragos" que a «condição pós-moderna» tem feito às duas ideologias dominantes no sistema escolar:
- A descanonização dos saberes consiste, acima de tudo, em ridicularizar o paradigma vertical-disciplinar da ideologia «iluminista», em contrapôr às hierarquias da ascensão um nivelamento que proibe a destrinça entre a ignorância e o saber –prolongando a diluição relativista da «alta cultura» no «todo cultural». Este fenómeno combina-se com o desprezo pela leitura e pelos suportes literários da mesma, com a despreocupada incapacidade de estruturação escrita e oral (e com a redução drástica do vocabulário disponível), enfim, com esse vasto continente que é hoje o «analfabetismo funcional» das culturas urbanas. A iliteracia «pós-moderna» é bem a consequência da já citada globalização mediática, cujo modelo audio-visual absorveu e reconverteu os processos de escrita e de leitura, ao mesmo tempo que substituiu o silêncio necessário ao trabalho da interpretação por um omnipresente ruído de fundo (essa música que invade os espaços públicos, as nossas casas e a intimidade dos walkman). E é também isto que explica por que motivo todas as tentativas escolares de estimular o gosto pela leitura desembocam invariavelmente no fracasso .


- Por seu turno, a ideologia das «novas pedagogias» acolheu os efeitos pós-modernos como se de velhos conhecidos se tratasse. Na verdade, ela "soube" antecipá-los. Mas, ainda assim, a incursão da «pós-modernidade» nas «novas pedagogias» acabou por descaracterizar as boas intenções emancipatórias de que estas se reclamavam. Assim, a componente de horizontalidade que, no modelo pedagógico dessa ideologia, contesta a relação de desigualdade entre professor e educando, é reinterpretada, na condição pós-moderna, como nivelamento descontraído dos saberes e dos actores da interacção educativa: enquanto se proclama que «tudo é diferente», anulam-se as diferenças que poderiam marcar uma distância hierárquica – o professor não detém qualquer privilégio, nem de saber nem de autoridade, sobre os alunos. Por outro lado, a componente de ludicidade, mediante a qual essa ideologia pretendia derrubar o «autoritarismo» do mestre e a «passividade» do aluno na relação pedagógica, é agora também reinterpretada como puro entretenimento, infantilização dos conteúdos, supressão das provas enquanto desafios. O sucesso escolar na versão de uma pedagogia debole ou "pedagogia pop", simétrica da «pop'filosofia» desejada por Deleuze.


A escola faz hoje figura de instituição anacrónica, um desses resíduos do passado persistindo teimosamente numa paisagem que lhe é cada vez mais indiferente – quando não mesmo hostil. Entre a crispação dos sitiados e a cedência às pressões no sentido de "actualizar" a escola, de a sintonizar com o "presente", é grande a tentação de se escolher a segunda hipótese. Estamos ainda longe do momento em que a condição pós-moderna se converterá, enfim, numa idade pós-escolar. Não sei se lá chegaremos. E não sei se, chegados lá, ainda nos recordaremos do que Goya quis dizer quando inscreveu numa sua gravura: «O sono da razão engendra monstros».


5. DISFUNÇÕES DO SISTEMA DE ENSINO


Encerrarei esta análise com uma reflexão imanente à escola, reflexão que assenta, não numa antevisão do seu fim, mas na constatação da sua permanência e da sua importância estratégica. À laia de síntese do que foi dito, interessa-me destacar os cruzamentos entre as ideologias de ensino, as políticas educativas e as consequências disfuncionais dessas relações tantas vezes perversas. Sei-o bem: o conceito de «disfunção» tem um lastro suspeito. Ele participa do ideário estrutural-funcionalista, esse travesseiro ideológico onde repousa a "boa consciência" do sistema. Mas a verdade é que não encontro melhor noção operatória para identificar os contra-sensos – justamente sistémicos – de uma instituição. Considere-se, pois, que esse termo incide sobre o conteúdo institucional da escola, sem se pronunciar a respeito da sua pertinência ou legitimidade.


O Quadro I descreve os efeitos disfuncionais do oportunismo com que o poder, em Portugal, tem recorrido às ideologias de ensino para legitimar políticas mutuamente exclusivas. É claro que subsiste sempre a hipótese maquiavélica de esses desfechos frustrantes serem a finalidade inconfessada de tais políticas, e o facto é que o telos do sistema educativo português parece mesmo ser o insucesso escolar. Este constitui, sem dúvida, o imbróglio mais visível, o pretenso "cavalo de batalha" dos sucessivos governos – e a encruzilhada de todas as ineficácias. Contudo, se afinarmos a nossa análise, veremos que ele é apenas parte de um conjunto maior de disfunções, que podemos derivar das contradições assinaladas ao longo deste texto. O Quadro II dá conta dessa abordagem.


Deslocando um pouco o âmbito de aplicação do conceito, diremos que as três primeiras contradições – e, particularmente, a segunda – ilustram esse fenómeno português que Boaventura de Sousa Santos denomina «carnavalização da política», isto é, a discrepância existente entre o discurso das intenções, proferido pelos agentes políticos, e a realidade das actuações e das práticas. Essa divergência mina o prestígio do Estado junto dos cidadãos, desvitalizando a nossa já frágil cidadania, instalada na impotência do cepticismo e no tal «distanciamento lúdico» ou «fársico» que propulsiona todo o tipo de relações manipulatórias com os órgãos institucionais – o "desenrascanço" com que o cidadão se procura "safar" por entre os interstícios do aparelho . No caso do sistema educativo, são múltiplos os abismos entre os compromissos programáticos, de um lado, e o quadro real onde se movem os actores sociais. Essas diferenças formam uma sub-contradição que percorre todo o sistema, e que se exprime nas inúmeras duplicidades da produção legislativa sobre o ensino.

Multiplicam-se as directivas que colidem entre si e cujo único propósito parece ser o de lançar a confusão no funcionamento das escolas. Essas «orientações» feitas para desorientar tanto podem incidir no calendário escolar, como na natureza das provas e dos exames a que os alunos serão sujeitos, ou na definição da carreira docente, do estatuto remuneratório dos professores e dos concursos para a colocação dos mesmos. Em todo esse magma de legislação avulsa é possível assistir às mais descabeladas violações dos princípios de equidade democrática na regulação do direito, não sendo incomum que o Ministério da Educação inverta, subrepticiamente, a primazia na ordem de subordinação dos textos legais, subvertendo as disposições de um decreto através de um simples despacho ou até de uma circular interna. Esta teia legislativa, espelho dos muitos meandros que se cruzam no imenso aparato burocrático daquele Ministério, serve variadas clientelas e grupos de interesses. O que só vem confirmar a crescente informalização do Estado, disperso em Estados paralelos e subterrâneos aos quais os portugueses alienam a sua cidadania .


6. DOS MITOS PEDAGÓGICOS À SOCIOLOGIA CRÍTICA


Gostaria de terminar com algumas considerações acerca do papel do sociólogo face aos problemas do sistema educativo português. Receio bem que, salvo uma ou outra excepção, a sociologia, neste ponto, se tenha deixado assimilar aos instrumentos demagógicos por meio dos quais o poder político se foi eximindo das suas responsabilidades. Com efeito, incorporada nas «ciências da educação», essa sociologia contribuiu para as prestidigitações, "reformistas" e "bem-intencionadas", de quantos nos pretendem fazer crer que as patologias do sistema educativo podem ser corrigidas mediante a acção "profiláctica" de tais «ciências». Devidamente oleadas pela ideologia das «novas pedagogias», muitas vezes recicladas em versão "pós-moderna", as «ciências da educação» determinam – como referi atrás – a selecção e a formação dos professores, para o que contam com o apoio do Ministério e o peso institucional de alguns lobbies – as Universidades, as Escolas Superiores de Educação e os próprios sindicatos –, cujas relações são, de resto, frequentemente conflituosas. Em uníssono, mais não têm feito do que iludir as causas estruturais do insucesso escolar e das desvantagens em que os alunos se encontram perante as exigências (contraditórias) do sistema educativo. Por isso, e para que a sociologia transforme a sua relação crítica com esse sistema, importa questionar uma série de mitos que têm dominado boa parte das teorias sociológicas da educação.


Um desses mitos atribui à escola uma missão salvífica: corrigir as desigualdades sociais que a realidade externa transporta para o seu interior. Esse mito parte de uma constatação que já é um "clássico" da sociologia da educação: a de que a escola confirma e reproduz essas assimetrias através da «rotulagem académica» dos alunos, baseada numa «cultura da discriminação» de que os professores são cúmplices activos . Tal «rotulagem» manifesta-se, entre outras formas, nas avaliações hierarquizantes, na diferenciação das classificações atribuídas, nas aprovações e reprovações, nas próprias sanções disciplinares – todo um conjunto de instrumentos que, segundo esta visão, contribuem sobretudo para «estigmatizar» os jovens em geral, e, em particular, os das classes sociais mais desfavorecidas, aqueles que apresentam «maiores dificuldades para ir ao encontro das expectativas» dos docentes.


Convém dizer que esta teoria é o último avatar de uma já longa tradição de tentativas para se encontrar o "culpado" pelo insucesso escolar. Os "culpados" vão-se sucedendo (primeiro, eram os próprios alunos, depois foi a sociedade, agora é a escola) e a desorientação teórica permanece . Na "explicação" actualmente dominante passa-se demasiado depressa das premissas para uma generalização paranóide, que detecta injustiças sociais em qualquer hierarquia e vê cenas traumáticas em todas as avaliações diferenciadoras. Daí segue-se rapidamente um outro imperativo, segundo o qual devem ser removidos todos os desafios, testes ou exigências que ponham os alunos em risco de frustração. Para coroar tudo isto, reclama-se a supressão total da selectividade, ao nível da escolaridade obrigatória, como condição fundamental para uma «escola democrática» .


Nesta versão, «escola democrática» traduz-se por «escola de sucesso para todos». Mas, como se sabe que esse sucesso é incompatível com a fixação normativa de um tipo ideal de aluno, resolve-se o problema relativizando o conceito de «sucesso escolar»: a cada um o seu "sucesso" – uma "solução" baseada no relativismo epistemológico e cultural hoje tão em voga: toda a particularidade cultural é uma virtude (especialmente se for a particularidade do oprimido) e afirma-se que não há sequer horizonte para além dos etnocentrismos que atomizam cada grupo (a «cultura universal» é, desde logo, arrumada como a «cultura do opressor») . Portanto, há que garantir a promessa: no fim, todos serão bem sucedidos, mesmo que não saibam ler nem escrever. Os «currículos alternativos», e a «flexibilização» anunciada pela próxima reforma curricular , aí estão a alimentar esta ilusão piedosa. Os pedagogos insistem: temos que ir ao encontro dos «interesses» dos alunos e, para isso, é preciso «adequar» os conteúdos programáticos às diferentes populações escolares . Dantes, a emancipação implicava transcender as limitações do etnocentrismo; agora significa reforçá-las em nome da auto-estima dos alunos e da defesa, a todo o custo, da heterogeneidade e da diversidade. Os «mais desfavorecidos», aliás, volatilizaram-se por detrás dos diferentes: «todos diferentes, todos iguais».


O «sucesso escolar» funciona, assim, como compensação simbólica para uma ferida narcísica que o sistema de ensino é incapaz de colmatar: «não fui mais longe, mas também tive sucesso». Por ser meramente simbólica, limita-se a confirmar a desigualdade social que pretendia corrigir.
Será preciso evocar, uma vez mais, os resultados desta política? Eu sei que «ignorância» é um termo proscrito e «politicamente incorrecto». Mas é de ignorância que é preciso falar. Uma ignorância, em todos os graus de ensino (incluindo o universitário), no que respeita ao domínio da língua materna, à capacidade de interpretar e de construir textos, às referências históricas, ao conhecimento científico em geral. Uma ignorância imensa e plural, que só uma enorme hipocrisia pode iludir, relativizar ou sublimar. Uma ignorância que não é, diga-se de passagem, um exclusivo de Portugal – o que, obviamente, não nos consola e só mostra que taxas superiores de «sucesso escolar» não significam melhores aprendizagens. Uma ignorância, enfim, que representa o meio mais eficaz de consolidar as assimetrias nas relações de poder e de privar os sujeitos dos instrumentos de análise crítica que lhes permitiriam pensar tais relações.


As suas causas são múltiplas e complexas, e não se devem apenas à hegemonia das «novas pedagogias» no processo de democratização do ensino. Não esqueçamos que os efeitos disfuncionais provêm, sobretudo, de contradições que minam qualquer projecto hegemónico. Mas só quem não tenha um mínimo contacto com a realidade das escolas portuguesas recusa a hipótese de essa hegemonia, mesmo que intrinsecamente contraditória, ser fortemente responsável pelo estado a que se chegou. Na medida em que a referida hegemonia se inscreve numa constelação de relações de poder inerentes ao sistema educativo, tudo indica que ela esteja a servir, objectivamente, para despotenciar os sujeitos em vez de contribuir para os emancipar.


Em suma, a ideologia pedagógica dominante conseguiu, na prática, o oposto do que pretende na teoria. Ela insiste na necessidade de salvaguardar a «qualidade das aprendizagens». Porém, como renunciou a qualquer definição normativa e universal dessa «qualidade», só podemos concluir que a insistência é puramente retórica. Uma impressão reforçada quando vemos o que certos teóricos das «ciências da educação» sustentam como solução para superar o insucesso escolar. É vê-los desvalorizarem a «componente curricular académica», por ser nela que os alunos registam as piores classificações , ou pretenderem que cada grau de ensino não deva preparar para o nível seguinte, mas permanecer condicionado pelo nível anterior . Assim se perpetua a contradição entre a escolaridade obrigatória e a não-obrigatória, alicerçada pela enorme desorientação que atravessa o "pensamento" dos "pedagogos". Exemplo dessa desorientação: enquanto que se elogiam as "virtudes" dos currículos diferenciados para o ensino básico, já no secundário a palavra de ordem é a uniformização… como meio de combate ao insucesso escolar! .


Parece-me, pois, justificada a suspeita de que os defensores destas ideias se propõem simplesmente aligeirar os conteúdos e baixar a exigência. O que, de facto, têm conseguido , com um único resultado assinalável: a maioria dos jovens chega ao secundário sem possuir as competências mínimas para enfrentar uma disciplina como a que eu lecciono. Mas os pedagogos do Ministério da Educação não desistem, e, em 1998, apontavam a «sobrevalorização dos conteúdos académicos» como um dos principais problemas existentes no ensino secundário .


Este ataque ao currículo académico obedece a uma premissa que importa desmontar: a de que esse currículo se limita a reflectir o padrão cultural da classe dominante. Para lá do viés relativista deste argumento, que reduz a cultura humanística e científica a um «etnocentrismo de classe», ele releva do mais estafado determinismo sociologista. Talvez a ordem de causalidade que ele sugere possa ser invertida para gerar a seguinte hipótese perversa: é graças à socialização num currículo académico, informado por um padrão de exigência, que os membros das classes sociais mais favorecidas adquirem o know-how necessário para se perpetuarem no poder. Aos pobres ficam então destinados os «currículos alternativos», com relevância para os «saberes pragmáticos» e para as «componentes não académicas» (trabalhos manuais, trabalhos oficinais, etc.) . Se isto não é uma óptima estratégia de preservação das assimetrias sociais, não sei o que seja.


O sociologismo que encontramos em muitas destas teorias da educação tem também um corolário: desresponsabilizar sistematicamente os alunos pelos resultados obtidos . O que, convenhamos, não é a melhor maneira de lhes propiciar a tão desejada autonomia. Trata-se, no fundo, de mais um exemplo de raciocínio binarista: as causas do insucesso ou estão nos alunos ou estão na sociedade, na escola e nos professores. Nunca se admite que os vários insucessos escolares – pois esse insucesso existe no plural, e não no singular – possam resultar da convergência de todos esses factores. Mais uma vez, em nome da preservação da auto-estima dos «coitadinhos», é a cultura da irresponsabilidade que se promove: «A culpa é sempre dos outros».


Entendamo-nos: eu não nego que a escola seja um poderoso sistema de exclusão, um sistema que antecipa os mecanismos excludentes do espaço de mercado. E também não afirmo que a alternativa defensável seja reforçar, nos alunos, comportamentos individualistas de competição que sirvam de treino para a concorrência comercial ou para a luta darwiniana por um posto de trabalho. O que eu digo é que esta questão não se esgota na opção entre uma escola competitiva e uma escola facilitista.


De resto, as premissas ético-políticas dos que contestam o ensino selectivo merecem ser interrogadas: será toda a exclusão moral e politicamente injusta? E será toda a selectividade necessariamente anti-democrática? Estas perguntas remetem para uma exigência crucial na teorização da democracia, que é a de pensarmos as dimensões não-democráticas que necessariamente se inscrevem na democracia.


Para pensar tais dimensões, não há como regressar a outro tema, tão velho como a própria teoria política: o tema da soberania. Conhecemos o que a doutrina clássica entendia a este respeito. Para ela, a atribuição da soberania confundia-se com a identificação da competência, de tal modo que a fonte do poder era identificada com o lugar do saber. Isto significava que nem toda a autoridade pode e deve ser partilhada, nem todas as decisões podem e devem ser objecto de negociação, e que nem todos os indivíduos podem deter autoridade sobre qualquer assunto. Esta concepção que, de facto, é não-democrática, atravessa no entanto o exercício da democracia. E por uma razão muito simples: nenhum sistema – mesmo a democracia mais participativa possível – funciona sem hierarquização de funções, sem uma distinção mínima entre instâncias de comando e instâncias de execução, havendo uma multiplicidade de contextos em que a distribuição das funções só resulta se for relativamente irreversível e desigual. E esta é uma situação que nenhuma denúncia foucaultiana das relações entre saber e poder consegue rasurar.


Ora, o processo educativo é bem o exemplo do que acabou de ser dito. A sua dimensão disciplinadora tem de começar por ser imposta antes de ser auto-interiorizada. E só mais tarde ela poderá ser objecto de avaliação, de problematização e de negociação. Muitos pedagogos pensam que democratizar a relação pedagógica exige o fim da desigualdade de poder entre professor e alunos, substituída por uma relação de «simetria» e de «reciprocidade», assente na «partilha» e numa permanente «negociação» da autoridade. Mas esta reivindicação confunde autoridade com autocracia e não reconhece a dimensão de coacção que está presente em toda a experiência educativa. Se alguma coisa aprendi foi justamente isto: que é na base das tensões resultantes da desigualdade entre professor e alunos que a relação pedagógica se pode construir e tornar-se produtiva. O nivelamento da autoridade não favorece a emancipação dos alunos ou a sua autonomia: apenas os desorienta. Pelo contrário, a autonomia cria-se no confronto criativo com a autoridade.


Para Hannah Arendt , o problema da soberania não é «como conciliar liberdade e igualdade», mas sim «como conciliar igualdade e autoridade». O desafio é, portanto, articular o regime igualitário com uma necessidade intrinsecamente desigualitária: a de seleccionar a elite política. Essa articulação é também a da exclusão e inclusão no interior de um paradigma de justiça, quando sabemos que estas são mecanismos inevitáveis e condições funcionais de qualquer sistema social. No caso da escola, o desafio reside em conciliar uma exigência não-democrática – a da selecção pela excelência – com a democratização do ensino. Isto requer a superação de todas as dicotomias que um certo discurso pedagógico pôs a circular: a oposição entre conhecimentos e competências, entre saber e «saber-fazer», entre o currículo uniforme e a heterogeneidade dos alunos, entre escola universalista e escola multicultural. Exige a imaginação necessária para começarmos a pensar as articulações possíveis entre os termos desses binómios.


O princípio da selecção pela excelência não é, em si mesmo, perverso, e o combate por uma definição emancipatória desse princípio parece-me estar na primeira linha da luta por uma escola genuinamente democrática. Esse combate requer que os critérios de excelência sejam subtraídos às lógicas de exclusão exercidas nos diferentes espaços de poder do sistema social. Mas esta é uma luta que extravasa muito para além do campo escolar. E enquanto ela não for travada, e decidida, em todos os domínios exteriores à escola, será inevitável que os modelos de hierarquização pelo mérito continuem a replicar as hierarquias de classe, e que os paliativos reformistas para evitar essa tendência incorram no mesmo vício.


Quanto ao «sucesso de todos», essa é uma mentira que, na melhor das hipóteses, significa o sucesso da mediocridade. E a mediocridade, tanto quanto sei, está longe de ser emancipatória…


MÁRIO ARTUR MACHAQUEIRO

 

IN: http://franciscotrindade.blogspot.com/2008/03/contradies-e-disfunes-no-sistema-de.html

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O Ensino da Fraude

 

O presente artigo foi escrito em 2000/2001 por dois professores, ligados ao ensino secundário e superior, por ordem de entrada. Destina-se a alertar a sociedade Portuguesa relativamente ao estado catastrófico em que o sistema de ensino se tem vindo a encontrar, e das razões que justificam essa situação. Se na leitura do mesmo ocorrer uma sensação de ter estado a dormir durante as últimas décadas, será então a altura de acordar. Este assunto diz-nos respeito a todos, e as consequências desta fraude politicamente correcta a que continuamos a chamar ensino serão irremediáveis.

 

 

Muito se tem discutido, nos últimos anos, acerca da qualidade do ensino em Portugal. Não é segredo para ninguém que, após o 25 de Abril, o sistema de ensino sofreu profundas remodelações e que a própria filosofia do sistema de ensino se tenha modificado de uma maneira irreversível. Durante esse período, em particular na última década e em especial durante o período de governação socialista a remodelação do sistema educacional tem sido muito activa, embora não do ponto de vista qualitativo. Essencialmente, a política demagógica dos últimos governos está a transformar o ensino numa espécie de fábrica de diplomas, onde são observadas como determinantes as estatísticas de progressão e de aprovação dos alunos, sem que haja a preocupação com a qualidade do ensino, onde a autonomia e o poder dos professores é reduzida ao mínimo, de modo a que possa haver o máximo controle destes por parte do estado; onde são aprovadas leis que dão ao ensino uma imagem de pseudo-democracia e pseudo-humanismo, à custa da transferência das responsabilidade de pais e de alunos para professores e de poderes de professores para pais e para alunos, mas onde em vez de se promover a autonomia, a criatividade e a qualidade dos alunos, se procura neles integrar, de uma maneira medíocre, uma filosofia de aceitação, de seguidismo, de estupidez intelectual, sem que haja a mínima preocupação com a qualidade dos conhecimentos que adquiriram ou desenvolveram.
Sem que haja, de nossa parte, um particular esforço em inventar expressões politicamente-correctas para descrever o estado de profunda catástrofe em que este e anteriores governos mergulharam o ensino, a expressão «fábrica de diplomas» adequa-se de uma forma perfeita aquilo que é hoje o ensino em Portugal; essencialmente, uma ferramenta política, manipulada pela mesquinhez de políticos desonestos de modo a satisfazer as primeiras necessidades dos eleitores, e onde os professores são cada vez mais transformados, de facto, em impressores de diplomas.
Os mecanismos burocráticos que regem os processos de avaliação no ensino básico e secundário são hoje em dia, altamente penalizantes para professores que reprovam mais do que uma percentagem «estatisticamente» aceitável de alunos ou que se atrevem, de uma forma rigorosa, a cumprir os parâmetros de avaliação ou a atribuir notas muito baixas: não é considerado «estatisticamente normal» dar um 3 numa escala de 20 a um aluno que não fez rigorosamente nada o ano inteiro; não é considerado «estatisticamente normal» reprovar mais do que 50% de uma turma de alunos que chegam ao 11º ano sem conhecimentos do 7º ou 8º e que nada fazem, não é considerado «pedagógico» atribuir a nota mínima a um aluno no básico; mas já é aceitável elevar um 9 para um 10 sem grande discussão; considerar todos os argumentos possíveis e imaginários para aprovar o aluno que por acaso é filho de um professor ou de uma pessoa influente. Um professor sabe que estará numa situação difícil se ao ter problemas com um aluno for o único professor a tê-los, porque será considerado a «prova» estatística como evidente da sua culpa....
Urge então perguntar porquê o sucesso da manipulação estúpida de argumentos estatísticos? Uma escola é considerada bem sucedida quando a percentagem de aprovações é elevada, mesmo que à custa do facilitismo descarado que o sistema impõe aos professores e que professores mais acomodados incutem nos mais novos. A resposta é que é fácil. De facto, é mais simples implementar uma política vergonhosa de facilitismo e aumentar artificialmente a quantidade de alunos com o diploma do 9º ano do que melhorar a qualidade do ensino. É mais fácil aumentar o número de vagas no ensino superior do que criar condições justas para que as pessoas possam aprender ou exercer uma profissão após finalizarem os estudos. É mais fácil, também, diminuir o grau de dificuldade dos exames do 12º ano, de modo a que as estatísticas «demonstrem» que os alunos são bem preparados...
Os conselhos de turma, constituídos maioritariamente por professores medíocres e marginalizados pelo sistema, acomodados ou mentalmente lavados por falsas pedagogias quando finalizam os cursos, são uma anedota: aprovam-se alunos à custa das desculpas mais incríveis que se possa imaginar, mesmo quando seja evidente que estes não atingiram classificações que justifiquem isso, quando o verdadeiro motivo, que nunca fica registado em acta, é que existe medo das inspecções do ministério e do trabalho que elas provocam. Para mais, existe uma lei «democrática» que dá o direito aos professores de um conselho de turma de alterarem as classificações (perdão, «propostas de avaliação») de um professor na sua própria disciplina, o que é feito com o maior descaramento, sem sequer haver uma preocupação em encontrar argumentos que validem tal alteração. Os professores que se recusam a aceitar estes processos são vistos como novatos, incompetentes ou causadores de problemas desnecessários. Até ao 9º ano de escolaridade o ensino é um autêntico folclore: são aprovados alunos com cinco ou seis classificações negativas, que assim contribuem para as estatísticas de «sucesso» da brilhante gestão educativa do nosso governo.
Não se pode ordenar a saída de sala de aula de um aluno que insulta e perturba, é preciso adoptar uma medida «pedagógica» e dar-lhe «tarefas». Mas este estado de coisas vai piorar ainda mais, quando se fizer aprovar a passagem administrativa dos alunos até ao 9º ano de escolaridade, e se a escolaridade se tornar obrigatória até ao 12º ano, quando as escolas se tornarem autónomas, e passarem a não contratar professores que não obedeçam às estatísticas... Aparte disto, aquilo que se observa como mais baixo e mais hipócrita, é o esforço (conseguido em muitos casos) de dar ao ensino uma imagem mais humanista: para «democratizar» as escolas deixam de haver conselhos directivos e passam a haver conselhos executivos (os professores só executam). As escolas passam a ter pseudo-orgãos de gestão constituídos também por encarregados de educação, alunos e funcionários, retirando assim o «ónus» aos professores de gerirem as escolas e desviando o poder de uma forma conveniente. Simultaneamente, aumentam-se as obrigações e o policiamento dos professores, numa estratégia desleal mas altamente demagógica que sugere uma imagem de (falso) rigor. Os professores vivem aterrorizados com a idéia de cometerem alguma falha numa vigilância de um exame, quando poderá surgir alguma «rigorosa» acção disciplinar. Existe uma razão fundamental para que este artigo se escreva hoje, e essa razão é de que, para variar, as pessoas se comecem a aperceber de que o problema de falta de qualidade do ensino em Portugal não se relaciona com uma questão de «má formação pedagógica» dos professores nem de qualquer característica mística que faz dos jovens de hoje em dia uma geração «rasca», mas é sim, em primeiro lugar, o produto de uma gestão criminosa e incompetente do sistema de ensino, aliada a uma política de laboratório de experiências para satisfazer o ego de falsos pedagogos medíocres e, também a uma atitude de profunda inércia e passividade de uma grande maioria de professores que se deixam transformar em «impressores de diplomas». Para isto contribui também a maneira abusiva como os professores no secundário são tratados, a política de contratações desumana que tenta fazer dos professores «descartáveis» (perdão, «candidatos» a professores) uma espécie de intrumentos sem personalidade própria. Era bom que abríssemos os olhos, porque o futuro do nosso país está a ser seriamente comprometido e os danos serão irreversíveis, e nessa altura, só nos poderemos queixar do que não fizemos, do que aceitámos quando poderíamos não ter aceite, daquilo que fingimos não ver, preferindo tranferir as responsabilidades para outros...
 
 Gil Fonseca (Professor contratado no Ensino Secundário entre 1997 e 2000)
 

 

É talvez um pouco estranho vir falar da realidade do ensino quando são tão poucas as pessoas que não têm um familiar no ensino nem estão no ensino, a estudar, a dar aulas ou a administrar. Porém, estou convicto de que os cidadãos estão enganados acerca do ensino e estão MUITO enganados acerca do ensino superior.
A minha experiência no ensino está essencialmente ligada às engenharias e às ciências. No entanto, penso que a minha descrição também é válida nas áreas das artes, letras, gestões, medicinas e outras. Isto porque todas as áreas do ensino pressupõem o mesmo desejo de aprender, melhorar, escapar à mediocridade e atingir a excelência. Ora é precisamente neste aspecto que reside o engano. Actualmente, ter um curso superior já não traduz uma competência superior. Diria até que ter um curso superior é mau sinal. Na grande maioria dos casos (actuais) significa apenas que não se arranjou nada melhor para fazer. É provável que ache incrível uma afirmação destas. Nunca encontrei ninguém que não ficasse espantado ao ouvi-la. Perguntam-me:
--Uma pessoa que queira aprender, para onde vai, então?
--Se aprender é realmente aquilo que quer fazer então, está bem, deve ir para a universidade mas, cuidado, você vai sentir-se muito sózinho. Actualmente, um diploma de curso superior não significa sucesso na aprendizagem mas sim sucesso na ultrapassagem dos exames, em que "ultrapassagem" contém todos os respectivos sentidos perjorativos incluindo o de ser dolosamente permitida. Claro que há excepções mas enquanto que há uns anos atrás era difícil encontrar um curso que não valesse a pena, hoje é difícil encontrar um que valha. A grande maioria dos estudantes não tem acesso aos poucos cursos superiores que ainda valem a pena. Apenas os privilegiados que estudaram em colégios particulares é que lá chegam. Por isso, se quiser preparar-se para a vida profissional então o melhor é empregar-se. Ao fim de cinco anos terá muito mais competência que um recém-licenciado. Se, por outro lado, o seu objectivo é obter um "canudo" ou fazer a vontade aos seus pais então a universidade é mesmo o melhor caminho. Neste caso prefira uma universidade pública pois nessas sai muito mais barato.
--O que me diz!!? Conheço vários licenciados que estão em empregos muito bons!
--Acredito que sim mas em quantos desses é que confia? Em quantos médicos é que confia? Por quantos é que passou antes de encontrar esses? Faço a mesma pergunta para engenheiros, arquitectos, advogados, gestores, tradutores, etc. Algum é licenciado há menos de cinco anos?
--Olhe, lá na firma está agora um rapaz muito novo que instalou os computadores em rede e os ligou aos telemóveis. Não demorou muito tempo e não tem havido grandes problemas. Nele confio.
--Tem a certeza de que ele é licenciado? Não, desculpe, tem a certeza de que ele é português?
Estes pequenos diálogos têm acabado em silêncio, sinal de dúvida ou de medo. Caro leitor, espero que quando acabar de ler este texto tenha passado do medo ao terror. É que estes pequenos diálogos não descrevem as causas profundas do problema nem transmitem a natureza catastrófica dos seus efeitos. Refiro, já a seguir, as duas causas fundamentais para a degradação do ensino superior.
  1. Pressão política no sentido de aumentar os números do "sucesso":
    1. Número de vagas nas instituições de ensino superior;
    2. Número de instituições de ensino superior;
    3. Número de cursos superiores;
    4. Número de licenciados;
    5. Número de alunos.
    Esta pressão revela-se através do único critério de financiamento do ensino superior: são favorecidas as instituições com os maiores números.
  2. Incapacidade das instituições de ensino superior para resistir à pressão política. Ignorar a causa anterior. Interesse por parte das instituições de ensino superior em responder rapidamente às directivas governamentais. Este interesse revela-se na quantidade de lutas pelo poder que decorrem no interior das instituições e na ausência de estratégia das mesmas.
Estas causas têm promovido uma degradação gradual da qualidade do ensino que se revela nos seguintes sintomas.
  • As notas deixaram de ter um valor absoluto e são corrigidas para garantir determinadas percentagens de aprovação. Nenhum professor assume isto, evidentemente.
  • Os melhores alunos gostariam de ser recompensados pelo seu esforço e preferem não ser confundidos com os piores alunos, por isso, abandonam precocemente a universidade para ir ganhar dinheiro. Isto é anacrónico pois poderiam ser os piores alunos a abandonar a universidade para, por exemplo, entrar num curso técnico.
  • Retirar a um aluno a possibilidade de fazer exame é considerado "ilegal".
  • São implementadas diversas medidas para limitar as taxas de reprovação. Repetir a mesma disciplina em todos os semestres, cursos de Verão, sistemas tutoriais, etc. Não se alteram os métodos pedagógicos.
  • A imagem da "superioridade": as disciplinas com exames difíceis têm enunciados pouco diferentes em anos consecutivos.
  • As disciplinas com grande número de alunos são divididas em várias disciplinas semelhantes com pequeno número de alunos mas "adaptadas" às necessidades de cada licenciatura, isto é, "limpas dos conceitos mais gerais".
  • As disciplinas experimentais transformam-se em disciplinas monográficas e as disciplinas de carácter fundamental dissolvem-se em disciplinas de carácter aplicado, por exemplo, as disciplinas de programação de computadores passam a disciplinas de utilização de software comercial.
  • É generalizada a opinião de que o número de alunos actuais que teriam aprovação em exames de há dez anos atrás anda perto do zero.
  • Profissionais com cursos técnicos de antes do 25 de Abril conseguem, sem estudo prévio, ter aprovaçao em exames actuais de disciplinas básicas universitárias.
  • Os alunos deixam as mesmas duas ou três disciplinas de cada curso para os últimos anos e, perante o insucesso repetido, acabam por perguntar: "Porque é que nós não conseguimos passar a estas disciplinas? É por sermos estúpidos?"
    --Silêncio.
Os argumentos para implementar todo o reportório de medidas de facilitação são do tipo: "Senão ficamos em desvantagem relativamente ao outro departamento ou à outra faculade ou à outra universidade"; "Tem razão mas não podemos fazer isso porque é ilegal"; "Não temos dinheiro para despesas de capital, só despesas correntes"; "Não temos pessoal docente suficiente para dar aulas aos alunos que vão chumbar"; "Não temos espaço nas salas para dar aulas a todos os alunos inscritos"; "Talvez a situação melhore quando houver menos alunos"; "Não se esqueça de que estamos a cinco minutos da praia". É curioso como estes argumentos são óptimos para justificar critérios mais rigorosos de selecção dos candidatos às licenciaturas. Contudo, são usados precisamente em sentido contrário. Todo o ensino superior está inquinado desta hipocrisia de fazer ao contrário do que se diz e de dizer ao contrário do que se pensa embora sem pensar o que se faz. É suposto o ensino superior continuar superior mas não passa, hoje, dum ensino secundário extendido no tempo. Facto: os docentes universitários prescindiram de classificar positivamente apenas os alunos que merecem. Enquanto não surgir uma crise, facilitar a obtenção de diplomas é conveniente para políticos, professores e alunos. Só não convém à consciência de alguns e não ajuda ninguém.
Caro leitor, já que chegou até aqui, permita-me ainda que foque um aspecto importante: a Educação tem um impacto determinante na cultura e, por consequência, na economia duma nação a longo prazo. Por esta razão é muito grande a responsabilidade dos professores. Essa responsabilidade não pode ser escamoteada por causa de políticas de curto prazo. Note, caro leitor, não pretendo regressar ao passado, apenas lembro que, mais tarde ou mais cedo, seremos todos obrigados a tomar decisões difíceis e que nessa altura convirá estarmos devidamente preparados. Confesso que me sinto envergonhado por só agora divulgar o engano que ajudei a perpetuar.
Quando se entra para a universidade fica-se preso por ter cão e por não ter. Não se aprende mais nem por já se saber bastante nem por ainda não saber nada. O melhor é não tentar aprender e continuar a cometer os mesmos erros de sempre. E se ainda não está aterrorizado então inscreva-se na universidade. Vai ver que, ao fim de algum tempo, consegue um diploma que não servirá para nada.
 
Luís Gonçalves (Docente do Departamento de Física da FCT/UNL desde 1994) »
IN: http://matagalatlante.org/nobre/hyt/portories2.html
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A Educação em Portugal, sg/ Mª Filomena Mónica

Sugiro a investigação reflexiva da autora, no público de hoje. Em entrada estendida para quem não não tenha acesso.

 

Vale a pena mandar os filhos à escola?

23.10.2007, Maria Filomena Mónica


A revolução contribuiu para que muitos acreditassem ser a educação o caminho para uma vida melhor


Ao longo dos séculos, a resposta a esta pergunta tem variado, mas uma coisa é certa: os pais só mandam os filhos à escola quando nisso vêem um benefício. Nos países protestantes, como a Suécia, os pais desejavam que os filhos soubessem ler, a fim de poderem meditar sobre os ensinamentos da Bíblia, e, nos países com uma forte mobilidade social, como os EUA, os pais ambicionavam que os filhos tivessem um diploma, por pensarem ser essa a via para subir na vida.

Quanto à oferta escolar, as situações variaram: os países que procuraram modernizar-se rapidamente, como foi o caso do Japão durante o século XIX, criaram uma rede escolar alargada; os impérios a sério, como a Inglaterra, aumentaram o número de escolas, como forma de subjugar, através da cultura, os nativos.


Pela negativa - e duplamente - Portugal é um caso paradigmático. Aqui, tudo jogou contra a escolarização. Nem os camponeses queriam enviar os filhos à escola, nem, se exceptuarmos uns hiatos temporais, estiveram os governos empenhados em ensinar o povo a ler. Em meados do século XX, o país ainda era uma sociedade rural, onde não só a educação estagnara, como as aspirações populares eram reduzidas. O Estado Novo não estava interessado em industrializar o país, muito menos em formar cidadãos esclarecidos. Foi por isso que chegámos a 1974 com mais de metade da população analfabeta.


A revolução contribuiu para que muitos acreditassem ser a educação o caminho para uma vida melhor. Ao longo das últimas três décadas, os pais fizeram enormes sacrifícios para levar os filhos até à universidade. Não é raro encontrarmos empregadas de limpeza ou taxistas - os indivíduos das chamadas classes baixas com quem os intelectuais têm contacto - que alimentaram sonhos quanto à mobilidade social dos descendentes. Vendo-os desempregados, sentem-se, como é óbvio, ludibriados. É no contexto da estagnação da economia nacional que devemos abordar a questão do abandono escolar. A publicação das recentes estatísticas do Eurostat que revelam que, entre os 18 e os 24 anos, 40 por cento dos alunos - mais do dobro da média europeia - abandonaram a escola levou os responsáveis a prometer o alargamento da escolaridade obrigatória para 12 anos. Mas as leis pouca influência terão sobre o que se vai passar. Perante a questão de ter de decidir se devem manter os filhos na escola, os pais interrogar-se-ão sobre duas coisas: em primeiro lugar, se se podem dar ao luxo de passar sem o contributo do seu trabalho (em termos sociológicos, o chamado custo da oportunidade da educação); em segundo, se aquilo que os filhos irão aprender na escola tem alguma utilidade.


Abordei este tema, no que diz respeito ao ensino primário, na minha tese de doutoramento. Entre outras coisas, pretendia averiguar se, durante os primórdios do Estado Novo, a escolaridade era bem vista pela população. Para meu desgosto, a conclusão foi a de que, para a imensa maioria, a resposta era negativa. Era-o nas regiões de propriedade minifundiária, onde uma criança de sete anos já podia tomar conta dos animais, apanhar lenha e ajudar nas actividades domésticas. Prescindir dela, enviando-a à escola, equivalia a uma descida do nível de vida da família. Um jornal de Viana de Castelo descrevia o modo como um camponês encarava a instrução primária em geral e a alfabetização das mulheres em particular. Interrogado sobre se tencionava mandar as filhas à escola, respondeu: "Nada, nada. Elas estão aqui mas é para trabalhar. Qual escola? Se lá fossem, mais tarde não lhes chegava tempo para se escreverem com os namoros". Saber escrever era um luxo destinado aos privilegiados.


Se tivermos em conta que a estrutura social dessa época não deixava antever qualquer mobilidade social, o comportamento deste camponês era racional. Numa sociedade em que as posições hierárquicas dependiam do nascimento, a instrução não proporcionava benefícios. Além de que, numa sociedade analfabeta, não saber ler estava longe de constituir um estigma. Manhoso, Salazar limitou-se a reforçar os traços retrógrados da sociedade que governou. Os resultados estão à vista: os 10 por cento de alunos de sete anos que reprovam na primeira classe são herdeiros de gerações de analfabetos.

Um momento houve, em 1974, em que tudo pareceu possível. Mas a esperança de que Portugal se pudesse tornar numa sociedade meritocrática está em vias de desaparecer. A maioria dos pais considera, mais uma vez, que não é através da escola que se sobe na vida, mas através de "cunhas". Por outro lado, olha o espectáculo dos licenciados no desemprego com espanto. Muitos, pais e filhos, pensarão duas vezes antes de continuar na escola. O problema do abandono precoce excede em muito o âmbito do Ministério da Educação: é bom que se perceba isto.


É verdade que o objectivo dos nove anos de escolaridade está praticamente cumprido. A isso ajudou, em grande medida, a evolução da sociedade portuguesa, com destaque para o facto de, na economia, o sector primário ter diminuído de forma drástica. Mais do que um bem de produção, os filhos passaram a ser um encargo. Já não há cabras para guardar, nem couves para plantar; vive-se nas cidades, onde as oportunidades para o emprego infantil escasseiam; ser-se analfabeto tornou-
-se uma vergonha. Em vez de vadiarem pelas ruas, mais vale, pensam os pais, que as crianças fiquem na escola, onde, mesmo que pouco aprendam, estão afastadas do perigo dos gangs. A escola passou a ser considerada um depósito, o que, na medida em que pouco dela é exigido, não é uma vantagem.


Quanto ao prolongamento da escolaridade, em nada contribuirá para diminuir a desigualdade social. A massificação do ensino encarregar-se-á de fazer diminuir o valor desse diploma. Do ponto de vista da mobilidade, o 12.º ano valerá menos do que a antiga 4.ª classe: não porque os alunos saibam menos, mas porque, ao distribuir um bem a todos, fica ipso facto desvalorizado. Os factos mais importantes são a evolução do mercado de trabalho e a melhoria dos curricula. Sem isto, o prolongamento da escolaridade apenas serve para esconder o desemprego juvenil.


Vem isto a propósito de uma reportagem, transmitida no Perdidos e Achados da SIC no último dia 13, sobre o que, passados nove anos, acontecera a um grupo de alunos da Escola Básica 2,3 da Trafaria. O que impressiona não é tanto a indisciplina pretérita, mas o facto de os rapazes estarem hoje a exercer, como se a escola nada lhes tivesse dado, a profissão dos pais (a apanha da amêijoa). No dia seguinte, Nuno Crato comentou o programa, salientando justamente a falta de ambição. O que se esqueceu ou não teve tempo de esclarecer foi que, para se desenvolver, aquela carece de um solo apropriado. Ora, no contexto em que foram educados, surpreender-me-ia que estas crianças ostentassem o achievement syndrome presente em países como os EUA. A existência de expectativas profissionais quanto ao futuro só nasce em sociedades dinâmicas. Infelizmente, não é isso que acontece em Portugal.


Professora universitária

Publicado por morfeu

 

IN: http://anomalias.weblog.com.pt/arquivo/404552.html

publicado por negra às 16:00
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O ensino após o 25 de Abril

«A massificação do ensino secundário após o 25 de Abril de 1974 conduziu a uma degradação do meio.

Alunos que não estão preocupados em aprender, mas simplesmente em transitar de ano (isto é, para eles é indiferente se se aprende ou não o importante é não apresentar em casa uma rapoza). Pais mais preocupados em que os seus filhos obtenha um qualquer diploma e não que fiquem a saber algo. Pais que delegam nas escolas a acção de formação como homens e mulheres. Associações de pais sem relevância no projecto educativo dos míudos. Professores em grande número muitos deles sem qualquer apetência para aquilo que vão ensinar. Ministério preocupado com estatísticas e desligado da realidade.

E isto se calhar do lado dos estudantes é em parte um reflexo ao actual estado da geração 500 euros. Têm dinheiro para umas voltas e para o último grito de telemóvel mas realmente não têm dinheiro nem para poupar nem para constituir família ou fazer um projecto de vida minimamente decente.

Do lado dos professores estarem fartos de ser vilipendiados pelo ministério, pelos pais, pelas necessidades de contenção de despesa (que entre outras coisas lhes adiaram as perspectivas de reforma) e que estão desmotivados para motivarem os seus alunos.

Do lado dos pais acharem que quando eram alunos os seus próprios pais não terem participado dos projectos das respectivas escolas e acharem que não vale a pena acompanhar a vida académica dos seus rebentos. Além de claro haver muitos pais que só o são praticamente em questões biológicas. Não têm o mínimo de ideia do que é isso de educar os seus filhos, fazem-nos.

Do ministério que há 50 anos que só sabe andar a fazer experiências pensando que tem soluções simples de varinha mágica. Só que não há soluções simples para problemas complexos. O ensino, em especial o ensino secundário via de ensino, tem excesso de pessoas, alunos e professores. O ensino profissionalizante em alguns casos pode ajudar mas talvez não seja tudo.

Os alunos têm que ser levados a achar que é importante, é capital, aprender. Que para aprender é necessário ter atenção, é necessário estudar, é necessário tratar os professores e os colegas com educação, é necessário ser curioso, é necessário interrogarem-se sobre aquilo que ouvem aos professores, lêm nos livros e vêm nos vídeos e noutros meios, que é necessário comunicarem e saberem comunicarimos, que é necessário experimentar, é necessário que os professores sejam despoletadores e sejam modelos para os seus alunos.

Nos meus anos de liceu tive 2 professoras de matemática excepcionais. Uma da velha escola (douturada em matemática na Suiça, com vários trabalhos publicados, enquanto estudante de douturamento, na Principia Mathematicae uma revista de matemática dos anos 40 e 50 não o livro do Newton) e uma professora da nova escola (da altura). A característica comum às duas era que nos tentavam motivar (não era fácil estávamos nos anos de 75 e 76).

São necessários professores motivados e motivadores para que os alunos se interessem (com raras excepções).

A cena só me fez lembrar 1975, não me recordo em que mês, no Salvador Correia, onde um aluno chamou uns militares da FNLA do Rádio Clube (ao lado) para ameaçar um professor que o tinha expulso da sala de aula.»

 

Carlos Sanches

IN: http://globpt.com/index.php/2008/03/21/existira-educacao-em-portugal/

publicado por negra às 15:57
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«Educação entre as cabeças da Hidra»

 

 

Todos reconhecemos que nunca, como nas últimas décadas, se investiu tanto em Educação – no orçamento, nas infra-estruturas, na formação de professores, na acção social, no envolvimento da sociedade civil, na estabilização dos corpos docentes, na definição de regras de funcionamento, na autonomia das escolas.

E, no entanto, são de pesadelo os números que nos falam do abandono e do insucesso escolares, a todos os níveis.
Naturalmente que é fácil encontrar culpados para isto: o Governo, que é para isso que servem os governos. E os alunos, que também para outra coisa não servem – apesar de não ser do meu conhecimento a existência de quaisquer estatísticas que nos provem, por a+b, que as nossas crianças e adolescentes sejam mais baldas, mais indisciplinados ou até mais burros do que os seus colegas dos outros países.

Diz-se que, no entremeio destas duas das muitas cabeças malignas da Hidra que é o nosso sistema educativo – o Governo e os alunos –, vive e frutifica uma estrutura humana que não poderemos esquecer: os professores, que até aqui constituiriam o verdadeiro objecto da política educativa, enquanto os alunos, ao que parece, não passariam de meros argumentos para a existência deles. Eu não creio que assim seja, mas nunca fiando – mesmo porque foram os sindicatos dos professores quem até há muito pouco tempo, de facto, mandou na Educação em Portugal. Com os resultados que estão à vista.

De onde me faço um ror de perguntas, a propósito das medidas do Governo que tanta contestação têm vindo a provocar. Porque não hão-de os professores cumprir, como todos os trabalhadores, o seu horário de trabalho? Porque não há-de a carreira docente prever uma progressão, feita com base em avaliação de desempenho, que permita que sejam os melhores a chegarem ao topo? Não será o sucesso dos alunos o real produto do trabalho dos professores? E o múnus docente, mais do que o trabalho administrativo ou de gestão, não deverá ser concretizado na sala de aula? Quem não quer que se definam as regras de funcionamento das escolas e da actividade dos professores e dos alunos? Não será a educação de cada criança um assunto de toda a comunidade, devendo assim esta ser responsabilizada no governo das escolas?

Ouvi um dia destes, num programa de televisão, uma professora ‘muito tia’ perguntar (com ar satisfeitinho) para que servia a jovens marcados pelo insucesso escolar aprenderem um certo conceito da geometria ou lerem uma peça de Gil Vicente. Porque, para aquela professora, os meninos maus (que, por acaso, são os que mais faltam às aulas, os que vivem em famílias desconchavadas, os que sobrevivem nos limites da marginalidade) o que devem aprender é a serem trabalhadores – indiferenciados e, de preferência, de biquinhos calados.
Professores, sei que os há. Mas na rua?

 

Luiz Fagundes Duarte
Professor da Universidade Nova de Lisboa. Deputado do PS»

IN: http://sol.sapo.pt/PaginaInicial/Opiniao/Interior.aspx?content_id=84553

publicado por negra às 15:55
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Irrita-me…

Irrita-me que a liberdade seja algo classificado como «sonho» na vida de um adolescente.

Qual é a explicação lógica para que seja tão tardia a sua conquista?
Muitas vezes ouvimos dizer que a liberdade só o é na sua essência, quando acompanhada de responsabilidade. Certo, não discordo, mas… se temos a responsabilidade de ir às aulas, a responsabilidade de fazer lidas domésticas, a responsabilidade de estudar, a responsabilidade até de gerir algum dinheiro, que exequível razão há para que esta mesma responsabilidade, fazendo o caminho inverso, não acarrete consigo a liberdade?
Irrita-me que, quando nascemos, a zona do cérebro dos pais responsável pela visão bloqueie. Eles vêem a nossa imagem, nascemos como seres indefesos incapazes de produzir qualquer tipo de coisa, exceptuando choro e fraldas sujas, e essa imagem não evolui. Eles mudam o penteado, mudam a mobília, trocam de carro, passamos da Monarquia à Republica, mas a nossa imagem mantém-se. Estaremos errados? Numa análise mais minuciosa conseguimos descobrir que eles vêem que temos capacidade para trabalhar, para estudar… Boa! Descobrimos que o cérebro que estava bloqueado até se desenvolveu! Ups! Desenvolveu-se do lado errado. Porque é que cresceu do lado que lhes convém e o lado que nos é útil se manteve intocável? Resposta simples: eles mandam, eles fazem as regras do mundo, mas depois têm a distinta petulância de afirmarem solenemente que até nos ouvem, porque o diálogo é a base da família, a petulância de dizerem que até fazem tudo por nós, até nos compreendem e a pior, esta irrita-me a sério, “quando fores mais velho, vais perceber.”. Isto sim, irrita-me, mas profundamente. Não me interessa se daqui a um dia, daqui a uma semana, daqui a um mês, daqui a um ano, daqui a uma década ou daqui a um século vou entender o porquê. O que interessa é que no presente não entendo e não entender ainda me deixa mais irritada, enfim…
Mas, há mais. Outra desculpa espantosa que a mim me levanta os cabelos é o facto de darem exemplos de casos de insucesso. “Tás a ver? Viste o que aconteceu? É aquilo que eu quero prevenir.”. Irrita-me, porque não ouvimos nós, todos os dias, notícias de acidentes rodoviários? É melhor deixarmos de andar de carro. Não é frequente ouvirmos notícias de pessoas electrocutadas? É recomendável erradicar a electricidade. E muitos mais exemplos se poderiam dar de casos em que a compensação é maior que o risco. E não podemos prevenir todos os riscos pois todos os dias eles se atravessam no nosso caminho. Mas esta desculpa dos casos de insucesso leva-nos a reformular o conceito de liberdade. Percebem, então, que a liberdade só existe quando acompanhada de responsabilidade. E quando não existem casos de insucesso, está tudo arruinado. Nunca, numa sociedade, irá haver 100% de sucesso e uma percentagem nula de tragédias.
Por isso, jovens, meus caros companheiros, da mesma maneira que introduzi o texto, assim o concluo: a liberdade é um sonho e irá sempre sê-lo para nós, os adolescentes. Pode ser que um dia possamos estar em lugares de poder e possamos mudar isto ou então teremos outros a escrever textos intitulados de irrita-me, mas, desta vez, quem os irrita somos nós.
 
por Sara
publicado por negra às 01:45
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Ser ou não ser… ou parecer que é

 O nosso sistema de Ensino possui uma originalidade rara em todo o mundo: enquanto a iliteracia dos alunos aumenta, nas estatísticas do Ministério da Educação, a iliteracia diminui. Como consegue o Ministério realizar esta maravilha? Com um autêntico "ovo de Colombo".

Elabora provas de exame aferição, avaliação ou lá o que seja com conteúdos do 5º. Ano para alunos do 10º. Sucesso garantido. Como complemento, o ministério aboliu as palavras exame e reprovar do seu léxico.
O Ministério da Educação é a maior fábrica de jovens indiferenciados, entre o ignorante e o inculto, destinados a carne para canhão no mercado de trabalho flexível, ou seja, descartável: trabalha três meses e vai à vida.
O Ministério da Educação está cada vez mais perto das famosas passagens administrativas inventadas pelo MRPP durante o PREC.
Poderia referir outro objectivo, as passagens administrativas pela antiguidade da inscrição do aluno na escola mas não quero ser acusado de imaginação delirante. Aguardo que a vida me surpreenda.
publicado por artesaoocioso

 

sinto-me:
publicado por negra às 01:36
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